Voz da Póvoa
 
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Há em “Terra Viva” a Vontade de Informar

Há em “Terra Viva” a Vontade de Informar

Pessoas | 23 Abril 2022

Vivemos na cidade o concelho. Com esta sintonia, somos capazes de descobrir pequenos jornais, mas grandes na sua atitude de informar. Desta vez, fomos até à freguesia de Aguçadoura, agora abraçada a Navais, conversar com o director do jornal ‘Terra Viva’, propriedade da Junta de Aguçadoura, para saber um pouco da sua feitura.

Daniel Eusébio Fontes nasceu em 1937 em Aguçadoura. Concluiu a 4ª classe, e já depois de cumprir o serviço militar, onde foi 1º Cabo, fez o 1º Ciclo no Liceu da Póvoa de Varzim. Nasceu e cresceu na agricultura, mas depois da farda militar, vestiu uma vida a farda de Polícia de Segurança Pública. É casado com a professora primária Sara Torres Eusébio e pai de 5 filhos.

“Em 1990, o médico Sérgio Cardoso, à data secretário da Junta de Aguçadoura, sugeriu a criação de um jornal e eu dei corpo à ideia. Foi também ele que deu o título de ‘Terra Viva’, um nome muito abrangente e que se adequa às terras que representa. Recordo que na altura eu colaborava no Notícias da Póvoa, onde escrevia algumas histórias e informação da minha terra, mas abraçar um novo jornal numa aldeia, inicialmente, pensei que não seria capaz. O primeiro número foi publicado em Março de 1990. Os primeiros passos do jornal ‘Terra Viva’ foram de alguma hesitação porque havia poucos acontecimentos dignos de registo e tínhamos dificuldades em arranjar notícias ou destaques para a primeira página. No princípio o Dr. Sérgio Cardoso, que em 2001 acabou por assumir a presidência da Junta, ajudou-me bastante. Fomos caminhando e contando com alguns colaboradores, alguns vieram de onde menos esperávamos, pessoas que se interessaram pelo jornal. Não imaginava que estaríamos hoje a caminhar para os 33 anos. Tudo mudou e as mentalidades também. Cheguei a ter alguns aborrecimentos porque alguém me pedia para publicar um artigo e depois caíam em cima de mim. Isso é normal em jornalismo, mas penso que o jornal nunca foi motivo de discórdia dentro da freguesia. Nunca misturei amizade com política”, recorda.

Em três décadas, as mudanças e o crescimento da freguesia, quer económico, social e cultural, segundo Daniel Fontes acabaram guardados no jornal da terra: “Os acontecimentos mais importantes podem ser consultados no arquivo da Junta, que funciona numa antiga escola. Depois, em cada edição vou publicando acontecimentos da história antiga da freguesia, algumas que vivi e outras que me foram contadas. Gosto muito de história e por isso escrevo muitos artigos. Naturalmente, a história da freguesia está primeiro, mas também escrevo sobre a história do país. Li muito sobre a II guerra mundial, não tanto sobre a primeira. Era ainda um miúdo, mas ainda fui muitas vezes à mercearia buscar alimentos com senhas. Havia senhas verdes, amarelas, vermelhas e de outras cores que representavam o arroz, o açúcar, o azeite, o pão ou outro produto alimentar. A guerra acabou em 1945, quando entrei na escola, mas as dificuldades prolongaram-se por muitos anos”.

E acrescenta: “Recordo-me da construção da nossa igreja nos anos 50 do século XX, escrevi muitas notícias sobre a sua história. Da velha igreja que acabou destruída, só a imagem da padroeira, senhora da Boa Viagem transitou para a igreja nova. Também escrevi como chegou esta Senhora no século XIX a Aguçadoura, consta que veio de uma freguesia do concelho de Amares. Chegou como Senhora dos Navegantes e foi baptizada Senhora da Boa Viagem. A igreja nova foi uma odisseia do povo de Aguçadoura que numa altura de muita pobreza conseguiu, com muito esforço e união, dar corpo ao nosso orgulho. Eu mesmo ainda ajudei a colocar umas telhas naquele templo religioso. A história dos moinhos de vento que conheci e que foram sendo abandonados, e em muitos casos destruídos para dar lugar a casas de habitação”.

O Jornalista revela a viagem do ‘Terra Viva’ até à caixa do correio dos leitores: “Organizo e dirijo o jornal, mas é a Junta que paga a edição. A distribuição é gratuita, mas há alguns leitores que oferecem donativos. Chegou a ser feito na Tipografia Camões, que depois de encerrar passou para as mãos de uma pessoa que trabalhou na Binográfica. Durante muitos anos foi a preto e branco, mas agora a primeira e a última página são a cores. São impressos 2500 jornais, vão 500 para Navais, 300 para o estrangeiro, Canadá, Brasil, Estados Unidos, França, Alemanha, Inglaterra e Suíça, onde temos emigrantes, e os restantes distribuídos em Aguçadoura. Normalmente, chega na sexta-feira, e no sábado de manhã, há 32 anos em cada dois meses que faço a distribuição pelas casas. Em tempos de pandemia apenas um jornal não foi publicado em papel, mas saiu na internet”. 

Daniel Fontes conta no seu currículo de vida 84 anos de existência e tem um desejo: “A idade não perdoa e a memória já não é a mesma. Tenho pensado muitas vezes a quem possa delegar a continuidade do jornal. Acredito que há gente na terra capaz. A presidente do Grupo Cultural e Recreativo de Aguçadoura, Virgínia Torres da Silva pode ser a pessoa indicada. Tenho pessoas que mandam versos e colaboram com textos, jovens catequistas que noticiam as actividades da igreja e até um jovem médico da terra que escreve um artigo sobre saúde. Nunca julguei que passados 32 anos ainda cá estaria a escrever à mão, porque nunca me adaptei a um computador, embora tenha escrito muitos anos à máquina”. E conclui: “Não ganho nada com o Jornal, ou melhor, ganho porque faço isto por dois motivos - gosto deste trabalho e muito da minha terra!”  

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