Voz da Póvoa
 
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Voluntariamente surdos!

Voluntariamente surdos!

Opinião | 4 Setembro 2025

 

 

Ah, tempos estranhos esses em que vivemos, nos quais as palavras correm mais depressa do que os nossos próprios passos!

É de se constatar no dia-a-dia: nem bem o outro faz menção de tomar fôlego, já há uma boca aberta para dar a conhecer a sua própria história, como se temesse desvanecer se não for ouvido.

A língua trabalha sem pausa ou intervalo, como se o silêncio constituísse real ameaça! E, nesse furor, olvida-se da escuta – essa arte mágica de dar abrigo ao que não nasce de nós, mas do outro.

O desejo de compreender é suplantado pelo de ser compreendido, fazendo do diálogo um monólogo a dois, marcado pela urgência de revelar a própria dor, o próprio júbilo, as próprias conquistas ou derrotas. Enquanto um se derrama, o outro, seletivamente surdo, rumina secretamente a próxima fala. As palavras são sementes jogadas ao vento, que não encontram espaço para germinar.

Dá-se, assim, o nascimento de frágeis relações, sustentadas somente pela ambição de serem vistos, sem a pretensão de ver. As pontes não são construídas, e cada um fala de sua margem do abismo, sem cruzar para o território do outro.

A ausência da escuta nutre uma solidão silente. Ainda que cercado de vozes, o coração sente o vazio de não ser realmente recebido. É como bradar ao precipício e ouvir apenas o eco de si mesmo. Não há relação possível onde inexiste espaço para o silêncio que acolhe.

Entretanto, basta tão pouco. Basta olhar nos olhos, oferecer a atenção inteira, calar sem pensar no que dirá a seguir, sem ensaio de respostas. Quem escuta com desvelo oferece ao outro a certeza de existir. E esse é o presente mais caro: fazer o outro sentir-se real no momento da partilha.

Talvez a cura para tanta solidão esteja em falar menos, para escutar melhor. Porque apenas na escuta ativa e verdadeira é que as palavras deixam de ser ruído e passam a ser melodia.

Não é à toa que o silêncio é de ouro!


Maria Luiza Alba Pombo 

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