Voz da Póvoa
 
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Viagem em Balão aos Serviços Púdicos da Nação

Viagem em Balão aos Serviços Púdicos da Nação

Opinião | 13 Setembro 2019

Libertaram o degredo e as televisões exemplificam e amplificam os guinchos dos trouxas e das leivas doiradas, que encabeçam o aplauso gargalhado ou lacrimoso do público, que assiste aos convivas a debitar graças ou desgraças. Os cultivadores do nacional cançonetismo trazem a coxa, o umbigo e o grunhido ao ritmo do disco riscado e da cassete esmigalhada. Depois vão ao Taiti cantarolar no intervalo do leilão das vacas dos emigrantes empreendedores.

É por isso que quem quis casar com o agricultor amigou mesmo. Com o Moura Neto é que ninguém quer. Para quem parou na idade-média da jurisprudência, até não é mal parecido. Há outros muito mais caladinhos a condenar ao xadrez os pilha-galinhas e a arquivar os ladrões de aviários.


Cá no burgo a gente desprevenida vai dando cabo do lombo nas lombas até que a coluna vertebral se alinhe no centro de inspecção. Aos bombeiros ninguém pergunta quantos saltos, berros e gritos deu o atropelado até chegar ao hospital. Urgência é andar rápido e as gincanas gastam mais combustível. Como desde a invenção da bicicleta ninguém sabia pedalar na estrada, pintou-se à direita e à esquerda os corredores.

O serviço público nunca foi tão maltratado e a culpa é vossa. O permanente folclore, as calças de licra pela rua ou no selim a oferecer saúde ao empreiteiro, um sintético para cada bola, a igreja e a feira dentro da escola, quem não enrola desconsola os presidentes. E até o político em parte incerta, a convalescer da percentagem, critica a permanente impunidade que dá rédea-solta aos corruptos.

Um Centeno às centenas de milhões só para os camaleões da banca e da União Europeia. Porque o aquecimento global não chega para descongelar as carreiras de nenhum funcionário público. Enquanto isso, os verdadeiros mestres do assalto, com a chave do cofre na mão, primeiro limparam o nosso dinheiro e depois usaram-no para encobrir ou atulhar as crateras lá deixadas.

Com a lata dos inocentes, administrações com vencimentos de milhões, restruturaram o paiol das suas intenções com encerramentos de balcões e despedimentos em massa. Agora, acham-se no direito de cobrar uma taxa pelo uso do multibanco, onde gratuitamente dispomos do nosso tempo para pagar contas, levantar e depositar o nosso dinheiro. Uma gente mais exigente e menos escrava mandava-os catar carraças para o zoológico da Assembleia da República ou do Parlamento Europeu, onde as mordomias não são escrutinadas pelo cidadão eleitor.

O que a gente precisa é de estudos que nos tracem um futuro negro para daqui a um milénio. Quem sabe o Camões ressuscite e mande queimar os Lusíadas. Quem sabe o Sebastião apareça e explique que afinal se perdeu no nevoeiro de um cachimbo d’água, depois de saborear o melhor chocolate de Ceuta. Quem sabe o Eça de Queiroz reconheça o berço onde nasceu e nos tire das grávidas dúvidas existencialistas, em que vivemos entre as duas cidades, depois dos Maias.

Cá pra nós, enquanto o balão não furar vou continuar a esvoaçar no delírio dos que não se comovem por tudo e por nada. É sempre melhor comer as cascas de laranja que espremer o sumo do nariz. Se não percebeu é porque não leu.

Júlio Verme

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