Voz da Póvoa
 
...

Turistando Lendas e Lugares – Ser é mais que parecer

Turistando Lendas e Lugares – Ser é mais que parecer

Opinião | 27 Fevereiro 2025

 

De pena em punho ela pôs-se a divagar sobre a natureza humana…

Na sua mente Freud, Thomas Erikson, René Le Senne e Gaston Berger dialogavam entre si sobre um tema em comum: a Personalidade. Aquilo que tornava cada ser humano único e, por conseguinte, uma ilha.

Uma ilha pois, e ela só descobrira há pouquíssimo tempo atrás, aquilo que ostentamos para o mundo é tão somente uma armadura que defende a nossa criança interior da mão armada do outro.

Sem perceber deixamos o medo tomar conta das nossas vidas. O medo do fracasso, da traição, da rejeição, da ridicularização e construímos barreiras cada vez maiores, muros que pintamos com cores mil, marcamos com brasões, avisos de perigo ou convites, enfeitamos com preciosas pedras ou armamos com espinhos e canhões, tudo de modo a ostentar aquilo que, na maioria das vezes, não somos, olvidando-nos de Ser.

Construímos represas ao invés de pontes e nos espantamos quando percebemos que acabamos por tomar a Solidão como “legítima esposa”, contrariando o instinto natural humano de viver em comunidade, de procurar refúgio num abraço, conforto no carinho, orientação nas palavras pronunciadas por bocas alheias a sua…

Dessa forma, ao isolarmo-nos do outro, adoecemos… adoecemos de corpo e espírito e não há medicina capaz de curar sem centrar-se na Verdade, no âmago da questão que é impossível ser revelada sem que deixemos cair a máscara.

Pensou nos versos de Fernando Pessoa, sob o heterónimo de Ricardo Reis:

“ Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.”

14-02-1933

Ela percebera que não havia modo de alcançar a Felicidade sem que mergulhasse no mais profundo de si mesma e desacorrentasse a Pureza, a Missão que trouxera na bagagem quando veio ao mundo.

Expor-se, sentir-se vulnerável, dar a cara a tapa, era um mal necessário que a tornaria mais forte e ciente das suas qualidades, fossem elas encaradas como virtudes ou defeitos, embora a necessidade nem sempre facilitasse o processo.

Ela sabia como ninguém o quanto era difícil despir a fantasia…

Olhar atentamente ao espelho e encarar cada ferida aberta, cada cicatriz, cada nódoa negra e cumprir a árdua tarefa de reconhecer aquelas pelas quais merecera se deixar marcar pois eram tão somente a reação do outro diante das ações que ela escolhera praticar, nem sempre centradas nos princípios da ética ou da beneficência.

Entendia que, para ser verdadeiramente plena, precisava estar nua. Precisava retirar cuidadosamente cada véu, cada trapo, cada escudo que cobria a sua Essência e que consistiam, em conjunto, a sua Personalidade.

Por quantos anos ela acreditara Ser a sua Personalidade! Quantos pessoas ainda creem que o seu Eu Verdadeiro constitui a sua personalidade?

Que não têm consciência de que a construímos para proteger o nosso Eu Essencial dos danos causados pela sociedade que nós próprios concebemos?

Que perde aos poucos a sua humanidade provocando a dor ao próximo na tentativa infértil de a afastar de si mesmo, ao invés de amar sem preparar as adagas para a luta iminente que está apenas no seu imaginário.

Nessa tentativa genuína de Evolução convidou a todos aqueles que a acompanhavam a, com ou sem ajuda, abraçar a sua criança interior, deixando a pessoa crescida e cheia de defesas desarmada diante da perfeição que existe em ser parte de um todo, sem precisar de destaques pois cada qual tem o seu papel na peça da Vida, onde o improviso cai melhor que a representação. 

Maria Beck Pombo, escritora

partilhar Facebook
Banner Publicitário