Voz da Póvoa
 
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Turistando Lendas e Lugares – Os sinos

Turistando Lendas e Lugares – Os sinos

Opinião | 13 Outubro 2020

Num dia outonal morno e claro, decide o casal levar as crias a passear.

Apertam com segurança a respiração e os cintos  e partem em silêncio rumo a natureza.

Não trocam uma única palavra durante caminho. Estão absortos em seus pensamentos, ocasionalmente importunados pelas crianças no banco traseiro, que merecem sempre respostas mecânicas e pouco satisfatórias.

Em que pensam?

Na avaria do carro? Na novela? No aniversário dos filhos, do casamento, em traição?!

Será que imaginam-se a desaparecer por entre as pernas de alguém? A emaranhar-se em algum processo? Na fadiga do trabalho, das relações, do cotidiano?

Calados traçam metas, criam projetos, elaboram planos de fuga que permanecerão entre grades, secretos, pois a ação é cão covarde que ladra sem morder.

Vai habituando-se à coleira, a ração  que mata a fome, não o desejo. Vai convencendo-se que algum carinho é melhor que nenhum e que, de qualquer modo, a corrente que lhe limita os passos também a proteje dos cães vadios.

Ergue-se o olhar para a estrada e numa epifania o singular torna-se coletivo: um amontoado de carros e pensamentos entrecruzados onde o único ponto comum para além da estrada é o silêncio opressivo, ocasionalmente importunado pelas crianças no banco traseiro...

Prestai atenção: as crianças são como sinos!

 

Maria Beck Pombo

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