Abriu os olhos devagar a medida que a luz do dia inundava o quarto.
Mal podia crer que já era a hora da despedida, qualquer tempo é curto quando a distância é longa demais.
Saltou da cama "de vereda" na ânsia de aproveitar cada momento daquele dia pois sabia que cada um deles bem poderia ser o último.
Pensou em toda a sua estadia na Pátria Mãe, nas mudanças que operaram dentro dela, na iluminação pela qual fora abençoada e convencida que mudar não é trair suas convicções, e sim lutar por elas com mais leveza…
Pensou na família, nos amigos que pôde abraçar e também nos que não pôde porque a vida cotidiana às vezes nos amarra pés e mãos, deixando-nos impossibilitados de sair do lugar e agradeceu a todos os deuses, a todos os orixás, a todas as entidades que a acompanham, guiam e protegem, em especial a Iemanjá, que a arrancou do luto e lhe devolveu o colorido da vida.
Vestiu-se e se encaminhou para fora de casa, mantendo os pés descalços sobre a relva verde que cobria toda a extensão compreendida entre a porta de entrada e o portão.
Sentiu um aperto no peito e aquela dificuldade em engolir que só se dá quando nossos olhos se enchem de lágrimas.
Deixou-as correr livres sobre seu rosto e regarem a terra que verdejava aos seus pés, enquanto presenciava a Esperança a brotar e espalhar sua energia no ar que preenchia seus pulmões a cada inspiração.
Sentiu-se, enfim, preparada para o adeus, pois compreendeu que não se pode despedir do Todo, tudo faz parte de nós e nós fazemos parte de tudo. Carregamos connosco parte de tudo que amamos, e deixamos para os que amamos uma parte de nós mesmos, mesmo que seja unicamente uma lembrança.
Voltou o olhar para dentro e desejou sorte à família: muito Axé para todos nós, que as ondas sempre me possam trazer de volta aos pagos de onde vim!
A vida se resume nos abraços que ligam as despedidas aos reencontros!
Maria Beck Pombo