Voz da Póvoa
 
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Turistando Lendas e Lugares – Lembranças de um tempo bom

Turistando Lendas e Lugares – Lembranças de um tempo bom

Opinião | 11 Janeiro 2023

 

Acordava de segunda a sexta-feira, impreterivelmente, às seis da matina. Tomava o pequeno almoço, que invariavelmente, era a metade que restara do hambúrguer da noite passada, alimentava os seus dois companheiros felinos e saía de casa a correr para apanhar o transporte público que a levaria para o campus da universidade.

Fizesse chuva ou sol a rotina semanal era a mesma: todas as manhãs ela enfiava-se no autocarro que levava dezenas de pessoas, apertadas como sardinhas, rumo ao campus.

O transporte sempre tinha espaço para mais um, ainda que os passageiros, quase sentados uns sobre os outros, reclamassem forte e feio com o condutor a falta de condições dignas.

Era costume aqueles que estavam sentados segurarem nas mochilas e pertences dos que estavam em pé num jogo onde o equilíbrio e a honestidade eram sempre vencedores.

Nada a satisfazia mais que olhar através da janela e espreitar respeitosamente a luz matinal banhar as lápides do Cemitério Santa Rita, tingindo a paisagem de verde e dourado, emprestando alguma glória à Morte e aos mortos de ali repousavam.

Muitas vezes imaginava-se a ler um livro deitada sobre uma das campas, a embalar com as histórias desse mundo aquele que dormia no além.

Ela gostava do que fazia, sempre lhe agradara perceber o funcionamento da vida, ainda que não fosse exatamente aquilo que estava destinada a concluir.

Tinha predileção pelo professor “JF”, que ministrava as aulas das disciplinas de botânica e tentava a todo o custo “educar” os seus alunos.

Ouvia-se do laboratório ao fundo do corredor situado no piso 0:

- Sete e meia é sete e meia, não é sete e trinta e um! E fechava a porta aos atrasados reservando a eles a lição da pontualidade. Noutras vezes ele exclamava aos discentes que espreitavam pela minúscula janela dos microscópios:

-Não são bolinhas! São ESFERAS!

E quando descontados pelos erros de português nas provas era a batalha final, sempre ganha por ele, claramente.

- Como podeis ser bons profissionais se não souberdes escrever a própria língua?!

Muitas lições deixara o professor JF, mas a maior de todas foi o valor de ser correto e de fazer o que quer que fosse com dedicação e empenho.

Às vezes as lições mais valiosas são as mais difíceis de compreender.

Maria Beck Pombo

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