Voz da Póvoa
 
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Turistando Lendas e Lugares – Há dias…

Turistando Lendas e Lugares – Há dias…

Opinião | 4 Maio 2021

Há dias em que não queremos acordar…

Não queremos a luz do dia a desnudar as nossas rugas ao espelho.
 
Não queremos esconder as feridas e cicatrizes dos olhares alheios.

Não queremos fazer o esforço sobre-humano de sorrir para o mundo quando percebemos que tudo aquilo que tínhamos guardado com tanta dedicação, com tanto amor, com tanto zelo, como se de um tesouro se tratasse, nos vê como uma bijuteria barata, totalmente descartável e perfeitamente substituível!

Há dias em que o único consolo é a bagagem. É um bilhete, só de ida, para outro lugar.

Uma oportunidade de recomeçar, cometer novos erros e esquecer tudo o que, agora, nos corrói o peito.

Abrir os braços e ser soprados pelo vento até um paraíso qualquer, que entorpecesse os nossos sentidos e anestesiasse a nossa alma despedaçada.

Jamais pensara que um dia ela se despedaçaria! Estava certa de que podia aguentar cada punhalada, cada ausência, cada desmazelo, afinal, ela é Maria, e as Marias, todos sabem, aguentam tudo!

Tudo, mas não por tanto tempo…

Há dias em que o desrespeito dói mais, o desamor dana mais, o descaso nos enterra vivos em nós mesmos e ali permanecemos, imóveis, acorrentados aos pensamentos que nos chibatam as costas, remoendo as escolhas que fizemos, as atitudes que tomamos.

Imersos na culpa e na certeza de que nunca tomamos uma única atitude na vida que nos favorecesse enquanto indivíduos pois tudo fora entregue aos outros, que não fazem ideia do sacrifício que exigiu cada uma das nossas ações, mesmo as que lhes pareciam egoístas.

E os outros sempre pensam que não passa da nossa obrigação, pois não?

A obrigação que temos de ser boa pessoa, boa amiga, boa esposa, boa mãe. A obrigação que temos em oferecer sem exigir nada em troca e de permanecer ali, sempre a entregar tudo de nós mesmos, ainda que recebamos apenas os restos daquilo que, prazerosamente, é oferecido, pelos outros, a terceiros.

A receber os braços cruzados, as costas voltadas, a cegueira e a surdez, o silêncio.
Há dias…

Há dias em que a esperança foge a cavalo e tudo perde o sentido. E a vida dói como uma bofetada na face.

Dias em que a Solidão é a única companhia que queremos, pois sabemos que ela nos acolhe e enxuga as nossas lágrimas, sem julgar.

Pois barganhar a presença alheia tortura mais que a ausência.

Hoje, para ela, é um desses dias!

Um dia onde a vontade falha, onde a cabeça dói, o coração aperta, o estômago queima.
Um dia em que só lhe apetece gritar ao mundo que ela não precisa dele, que ela não precisa de ninguém!

Que precisa apenas se manter bem longe de quem só tem mãos vazias ou adagas para lhe oferecer.

E almeja que, em um dia como esse, consiga romper todos os laços e passar a ser livre de todas acusações e tormentos que ela própria se impõe, na ânsia de não falhar com aqueles que pouco se importam com ela.

Talvez um dia, leve como uma pluma, ela possa planar no vento e pousar sobre um campo qualquer, verde como as suas íris, e ali adormecer, sem sonhar.

Ela já está destroçada demais para perseguir sonhos!

Maria Beck Pombo

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