Bem se sabe que os felinos são donos de personalidades memoráveis, mas a minha Tigrona conquistou literalmente Ximangos e Maragatos!
Conheci-a numa situação bicuda: como a cria mais fraca da ninhada, era perseguida pela progenitora que queria sacrificá-la pois não conseguia alimentar todos os filhotes.
Não pensei duas vezes (nem sequer no facto do meu pai preferir o capeta a um gato) e “roubei" a tigrona da "mãe".
Mal aguentava-se em pé a pobre bichana. Tinha tantas pulgas que mal via-se a pele por debaixo do pêlo e esvaiu-se em sangue enquanto eu e minhas irmãs (companheiras para toda e qualquer asneira desde que perfeitamente justificada por um bem maior) tentávamos dar-lhe um banho.
Diante da situação toda aquela bolinha de pêlo começou a miar em alto e bom som, para o nosso mais profundo desespero.
A Marina então começou a cantarolar uma música qualquer, seguida da Rosa e da Mariana e em menos de um minuto nós as quatro cantávamos tresloucadamente na casa de banho para abafar o som dos miados enquanto meu pai, furioso (e totalmente descrente da nossa ousadia), batia do outro lado da porta a indagar:
" — Vocês têm um gato ai dentro?!"
Não havia volta a dar, naquele momento tínhamos de decidir se entregávamos o pobre bichinho à própria sorte ou se era a hora da “rebelião”.
Foi então que as gurias distraíram meu pai enquanto eu pus a Tigrona dentro de uma mochila (isso mesmo! De uma mochila!), saltei a janela de casa e me fui, as nove horas da noite, bater na casa do nosso vizinho veterinário a implorar ajuda para aquele animalzinho.
Dez dias ela la ficou internada, quase desenganada, mas sobreviveu.
Sobreviveu e foi sempre a gata mais forte da vizinhança.
Enquanto os outros felinos presenteavam seus donos com ratos, a minha trazia-me cobras-cegas e, vez por outra, algum canário desavisado de algum vizinho descuidado...
É claro que como boa mãe que sou sempre reprendia a paixão da minha gata em bater nas gaiolas da vizinhança mas ela nunca pareceu entender muito bem. Limitava-se a olhar-me nos olhos e miar baixinho como quem não tem bem a certeza de ter dito um palavrão e timidamente pede um dicionário.
Tinha um espirito tão cativante e uma personalidade tão marcante que conseguiu ganhar até os carinhos do meu pai, que sempre detestou gatos!
Dezoito anos viveu a minha felina e durante esse tempo foi campanhia e afeto não só meu, mas de muito andejo pelas bandas de lá.
E há dois anos ela partiu lá para o andar de cima. Foi levar carinho, amor e cobras de presente para São Pedro.
Todos os animais merecem o paraíso!
Maria Beck Pombo