O dia içou-se sem preguiça muito antes do nascer da aurora.
De malas prontas rumamos para o rincão onde minha cria fez casa, almejantes por sentir-lhe o cheiro, ouvir-lhe a voz, beijar-lhe a fronte. As suas duas Marias, mãe e irmã.
Estendia-se, costeando a estrada, um tapete de fresco verdor alimentado pela chuva.
E o sol dançava entre nuvens que de mãos dadas giravam revelando e escondendo seu fulgor.
Ao nosso redor o mundo andava a um passo ritmado como quem predissesse a melodia composta pela saudade e entoada pela euforia.
Curioso como uma única palavra pode reunir em seu seio dois conceitos totalmente distintos: perda e ternura, sem perder da ternura a intenção.
De braços abertos a espera, cheio de um amor sem máscara, estava ele.
Ansioso para gozar de um fim-de-semana que obrigava-nos a recolher e apreciar a companhia unicamente uns dos outros, estreitando laços que o mundo moderno faz questão de desatar.
Andamos por entre as ruas despovoadas cantado em capela antigas canções, em que “Genis” repousavam entre “Retalhos de Cetim”, embaladas pelo “Hino Riograndense”. E a cidade envolvia-nos abençoada como um templo, a abrigar nossas vozes e almas em uníssono em preces por um tempo que passasse sem pressa como nossos passos e por um reencontro urgente aquando da despedida.
Vivazes festejamos tardiamente o Día de los Muertos com direito a doces, maquiagem e muito amor. Festejamos a vida e a morte que dela faz parte, assim como o anoitecer completa o dia e os reencontros as despedidas.
A vida encerra pequenos ciclos, há que conhecer tristeza para estimar a alegria, abraçar a angustia para reconhecer a felicidade, perder para saber ganhar...
Desse modo, perdendo a maior parte da vida do meu rebento, ganhei sem dúvida os melhores momentos com ele vividos, onde a realidade abre caminho para a fantasia e permite-nos sonhar de olhos abertos.
Amordaçados percebemos que os olhos sorriem mais genuinamente que os lábios!
Maria Beck Pombo