A noite caía mansa e oferecia abrigo à Solidão, que estreitava as paredes do quarto fazendo-a sufocar.
O quarto, que outrora fora aconchegante ninho, passara a ser triste campa a sepultar os sonhos e a vontade.
Fixou as pálpebras abertas para que as pupilas engolissem, famintas, a escuridão que a preenchia e dilacerava a alma.
Sentia o corpo quente ao lado, que carregava um coração de gelo, tenso e imóvel, quase ausente. Como se temesse acordar a fera que rangia os dentes e tentava, desesperadamente, pôr rédeas na vontade de vomitar, sem perdão, toda a revolta que engolira com o passar dos anos.
Os lábios que carregaram promessas, recheadas de “para sempre”, despediam-se dia após dia, em silêncio.
Caiu nos vãos do pensamento a relembrar sua história de amor, que desvanecia aos poucos sob a chuva fina da desilusão.
Não conseguia perceber em que parte do caminho perderam-se... um do outro.
Não era capaz de dormir: as palavras ácidas corroíam-lhe a garganta enquanto a razão mantinham-nas cabresteadas a evitar o estouro dessa tropa cruel em debandada.
Assim permaneceu, até o dia nascer, cinzento como seus cabelos, a chorar o precipício que se abria entre os dois.
Encarou o nada e cuspiu-lhe na face!
Levantou-se e vestiu-se de coragem, determinada a regar a planta-amor já quase seca, envenenada pelo abandono. Com a esperança de ver-lhe brotar novamente as folhas, sem ter a certeza se tal conduta significava força de espírito ou fraqueza.
Nem sempre a esperança é uma bênção!
Maria Beck Pombo