Nas noites em que a lua faz-se cheia e as lembranças perfuram como adagas, eu exorcizo os meus fantasmas com pena e papel.
Enquanto as lágrimas congelam meu rosto eu grito alto a todos os santos e algo mágico acontece: nada pode fazer-me chorar mais.
Sou guiada pelo meu coração e, muitas vezes traída pela intuição, mas sei que a culpa não é dela.
Culpada é a crença cega que deposito na humanidade, constantemente a buscar o melhor dentre o pior. Algumas vezes o melhor não existe ou simplesmente não pode ser dedicado a mim.
O espelho mostra-me as rugas que colecionei durante todos esses anos, mas continuo a sentir-me uma guria.
Eu cresci, mas não envelheci!
Aprendi com meus erros, lapidei defeitos, amadureci qualidades e rejuvenesci a cada passo dado em direção a realização dos meus sonhos.
E nem mesmo Boitatá, quando assomou-se em minha frente, ousou consumir meu olhar.
Apontou antes sua luz fria e iluminou-me o caminho de volta, pois em alguns momentos é preciso regressar para poder seguir adiante.
Tantos desertos atravessei, por tantas vezes eu morri, e atalhei a vida mais do que era necessário.
Tantos incêndios comecei, tantas batalhas eu travei, por tantas vezes perdi e venci sozinha.
Tantas canções eu aprendi, tantos relatos escrevi, tantos amigos eu perdi, tantos domingos longe da família.
De tantas peleias esquivei-me e outras tantas empecei, tantas traições comprei por esmeraldas.
Mas meu peito não secou e cada ferida que sangrou marcou o início de um novo crescimento
Eu orei a todos os deuses, iluminei todos os santos e trouxe oferendas a todos os orixás.
E na certeza de ser digna de tamanha proteção eu bendigo todos os dias que virão.
Ao tempo que se despede dia-a-dia eu agradeço cada momento.
E a cada pealo eu agradeço a lição.
Por isso hoje quero brindar a todas as conquistas e derrotas que ensinaram-me a conquistar.
Quero brindar o tempo e por ainda haver tempo para os recomeços.
Quero brindar as forças poderosas que acompanham-me e protegem-me do inimigo, mesmo quando o inimigo sou eu. Quero agradecer também àquelas que ensinaram-me a lutar.
Quero brindar a vida que se manifesta a cada segundo e lembrar ao mundo que não existe data no calendário dos homens que impeça ou permita mudar de destino, escolher ser melhor ou valorizar o que se tem.
Muitas vezes é preciso crer para ver!
Feliz Ano Novo
Maria Beck Pombo