Voz da Póvoa
 
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Turistando Lendas e Lugares – A marca da tradição

Turistando Lendas e Lugares – A marca da tradição

Opinião | 9 Fevereiro 2021

Ah, que saudade do meu pago!

De tudo aquilo que deixei para trás, que desonrei com a minha sede de pousar os olhos sobre outras paisagens, que reneguei em busca da modernidade.

Saudades das férias na Estância Santa Isabel e outras poucas da Estância Santa Elza, onde eu e os meus primos, pendurados nas tábuas da mangueira, víamos os peões e o capataz a castrar novilhos e ovelhas, a assentar-lhes a marca incandescente da Estância pouco acima do garrão.

Eu, guria citadina, presenciei poucos “Dias de Marcação”, na minha infância.

Pouco montei a cavalo e nunca lacei boi nenhum.

A tradição, para mim, limitava-se às danças ao som do acordéon, bem tocado, do meu avô.

“Ai bota aqui, ai bota aqui o seu pezinho, o seu pezinho bem juntinho com o meu. E depois não vá dizer que você já me esqueceu…”

Cantávamos defronte a porta da “casa grande” onde podíamos vislumbrar o baloiço improvisado sob os galhos de uma árvore tão antiga quanto a própria estância, e também o corredor de cinamomos que se estendia até a porteira.

Danilo, assim se chamava o meu querido avô, que só deixava de lado o instrumento para prender-me entre os braços enquanto dizia:

“— Diz a palavra mágica, Bruxa Branca!”

E apenas me largava depois que eu retrucasse:

“— Abracadabra, perna de cabra!” E caíamos na gargalhada.

Conheceu Santo Onofre muito cedo, meu avô Danilo…

Deixou-me por cá, aos oito anos de idade, totalmente perdida no seio de uma família em que ser a ovelha negra não era exceção à regra. Entretanto, era muito importante andar bem travestido de boa rês, para integrar perfeitamente a sociedade circundante.

Apenas na adolescência descobri minha verdadeira ligação com o campo. Ela não vinha propriamente da terra, mas sim da música que exaltava e eternizava os seus costumes.

E, “despacito no más”, passei a vivenciar histórias sem experenciá-las de facto.

Via-me montada a cavalo, de laço na mão a pealar novilhos e cavalos redomões.

Ao derredor do fogo a matear recuerdos ao cair das noites.

A lutar, de fuzil e adaga em punho, junto a Garibaldi durante a Revolução.

Eu, que não herdei a destreza exigida para a lida dura dos pampas, herdei o ofício das palavras e o destino de levá-las até os confins do mundo. Juntamente com o alento a toda a china ou índio vago desgarrados da querência a andejar pelos pagos de cá.

Porque onde tem um gaúcho, “mano véio”, tem mate, pampa e tradição, pois o Rio Grande é uma marca gravada a ferro e fogo dentro do pampeano coração!

 

Maria Beck Pombo

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