Voz da Póvoa
 
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Turistando Lendas e Lugares – A fé é seu próprio templo

Turistando Lendas e Lugares – A fé é seu próprio templo

Opinião | 22 Março 2022

Vez por outra ela gostava de entrar em um templo cristão qualquer, sentar-se num banco, contemplar a suavidade da luz que atravessava os vitrais e escutar o silêncio lhe falar à alma.

Noutras vezes preferia a agitação dos terreiros de umbanda e candomblé, com os sons dos tambores que faziam palpitar mais alto o seu coração.

Sentia imensa vontade de dançar em torno de uma fogueira a cultuar a Deusa Mãe num Sabbath sob a luz da lua…

Acendia diariamente uma vela para Yemanjá, usava sempre consigo o anel de São Jorge deixado pela sua bisavó, bem como o Selo de Salomão adornando seu pescoço e agradecia vezes sem conta, a todas as entidades, a cada graça a ela concedida, uma por uma.

Duvidava veementemente da existência do inferno, do paraíso ou da reencarnação. Para ela tudo isso se resumia à esfera terrena, e nela tinha início, meio e fim.

Estava longe de crer que o corpo era apenas um invólucro para o espírito, estava certa de que o espírito habitava cada célula e, dessa forma, parte dele passava adiante através das gerações. Razão pela qual sempre teve muita atenção aos exemplos que deixava como herança para a posteridade.

Parecia-lhe impossível confiar que o Universo fosse obra de apenas uma força criadora.

Como poderia explicar uma natureza tão complexa?

O milagre do nascimento a contrastar com a atrocidade das larvas das moscas que comem as lagartas de dentro para fora, tornando possível a sua preservação, a riqueza do mar que fornece o peixe aos famintos e a devastação deixada pelos tsunamis, a suavidade da brisa que refresca e planta as sementes e a inclemência dos furacões.

Sempre rendera homenagem a todos os deuses, sempre pensara que a própria Vida era uma espécie de divindade e que a maior de todas era o Tempo.

Era, portanto, uma discípula da Vida e do Tempo, e de todas as entidades compreendidas entre os dois.

Mas por vezes quem em tudo acredita, em nada crê para além de si mesmo. E crer apenas em si pode ser muito solitário e quiçá desesperador, quando não encontramos dentro de nós as respostas para as dificuldades que nos afligem.

Criara, portanto, um alter-ego que era a soma de todos os deuses, capazes de indicar ao seu inconsciente a solução para todos os problemas que poderia enfrentar em seu cotidiano, uma entidade na qual poderia depositar toda a sua fé, pois a conhecia como nenhuma outra poderia.

Para ela Deus e o diabo são a manifestação da vontade do próprio homem, que usa, covardemente, desse artifício para justificar suas boas ou más ações, especialmente as más.

Mas as forças da natureza são inegáveis e incontroláveis divindades, que se manifestam livremente e independentes do julgamento humano. Senhoras de si e da criação ou destruição que semeiam pelos caminhos onde cruzam, já que muitas vezes é preciso destruir para construir o novo e dar continuidade ao ciclo da vida.

A sua religião consistia em plantar o bem e o respeito por onde passasse, em fazer o mundo perceber que o homem não precisa depositar a sua crença em outros homens, nas instituições criadas por eles para controlar o mais fraco e estava certa de que assim encontraria a paz quando fechasse os olhos para sempre.

Amar o próximo como a si mesmo e ao Universo sobre todas as coisas, heis o segredo para encontrar a merecida paz!

 

Maria Beck Pombo

 

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