Não podia duvidar que a sua vida daria um livro sem que o precisasse ornamentar com a ficção.
Andara por caminhos diversos, a colher flores e arranhar-se nos espinhos, a recolher cristais e contornar obstáculos, a construir pontes e derrubar vedações…
Bebeu de água de fonte pura, mas também de amargo veneno, distribuiu abraços e golpes de adaga, e também os acolheu de corpo e alma.
Perdeu as contas de quantas vezes encontrara o novo primeiro amor e de quantas vezes acreditara ter seu coração partido para todo o sempre.
Escrevera mais que um livro, gerara mais que um filho, plantara mais que uma árvore e representara tantos papéis que lhe foi trabalhoso descobrir quem era verdadeiramente quando se fez necessário que o descobrisse.
Heis o destino que carrega: repleto de escaladas, quedas e situações inusitadas que a fazem sentir como se tivera vivido mil vidas.
Como se cada momento dele encerrasse em si uma pequena história cheia de significado e de ensinamentos que apenas ela poderia registar para a posteridade.
Possuía uma vida preenchida como poucas pessoas possuem, mas porque escolheu vê-la dessa forma: o laboratório para as experiências dos sentidos e dos sentimentos. Onde a dor, o riso, a alegria, a tristeza e tudo o que se pode colocar entre eles não são calados ou condenados. São apenas sentidos, ouvidos, acolhidos…
São encarados como grandes mestres a revelar os mistérios da transmutação e transformar em novo a partir do antigo, sem o extinguir, pois aprendera desde tenra idade que “na natureza nada se perde, tudo se transforma”.
E assim segue transformando a si mesma e a sua história, inspirando outras pessoas a transformar em arte o real, sem necessitar do fictício!
Maria Beck Pombo