Voz da Póvoa
 
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Senhor Árbitro, posso jogar descalço?

Senhor Árbitro, posso jogar descalço?

Opinião | 17 Agosto 2021

À pergunta inusitada, surpreendente, que poderia responder o árbitro no intervalo do jogo do Boavista-Varzim, 1ª jornada do nóvel campeonato de principiantes, no Bessa ainda pelado e antes da remodelação? A resposta foi um “não” ao pedido do Travaços, apelido dado pelos pescadores ao Marques, talvez saudosos do “armador de jogo” dos 5 violinos. Importa que se diga que o Marques levou consigo para a demanda, Rui Samúdio (que assina o meu cartão de atleta/júnior do Varzim, numa direcção que tinha o Dr. Nunes Guerreiro presidente) e Jorge Baldaia para corroborarem que o jovem jogador tinha os pés cheios de bolhas, pés não habituados ao aconchego dumas chuteiras. Marques teve que jogar a 2ª parte como mandam os regulamentos e grandes foram as dificuldades em descalçar as botas atrofiadores da prática do ludopédio.

Jogar futebol descalço era vulgar entre o rapazio da beira-mar, em jogos intermináveis na areia grossa das nossas praias. Que permitia mesmo jogar em pisos de terra batida, melhor seria em relvados como me sucedeu num “campo de trabalho” numa aldeia na Holanda (agora Países Baixos, nem sei bem porquê); na aldeia havia uma equipa de adolescentes, equipados a rigor, que mediam forças com os estrangeiros que, de quinze em quinze dias demandavam o “campo” ajudando nos acabamentos duma casa de abrigo para as crianças mais pobres. Joguei apenas com umas meias o que não foi estorvo para uma inédita vitória, com ajuda de dois outros portugueses e dum marroquino.

Voltando ao Marques. Na época seguinte, 64/65 (época em que joguei na velha Académica de Coimbra de tão boas memórias) jogou nos juvenis – na antiga loja do Varzim, na parede por detrás do balcão, havia uma grande e belíssima fotografia a preto e branco, com esta equipa em que eu reconhecia, além do Marques, dono da bola, o Alfredo Ferreira e o meu primo Alfredo Travessas, “O araminho”, bom de bola também - e depois rumou ao Benfica onde foi júnior. Conhecedor do sucedido, o dirigente Zé Pereira mandou fazer umas botas à medida dos pés delicados do Travaços.

Regressou ao Varzim, treinava Ricardo Perez:

- Marquez, encosta à linha! - Não posso, mister. - Porquê? -Porque pode vir o comboio! -Sempre o mesmo!

Abílio Travessas

 

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