Voz da Póvoa
 
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Póvoa, cidade azul e cinzenta

Póvoa, cidade azul e cinzenta

Opinião | 6 Fevereiro 2025

 

Historicamente, devido à sua ligação ao mar, a Póvoa de Varzim sempre esteve associada à cor azul. No entanto, uma nova cor tem-se associado à cidade, o cinzento, devido a escolhas urbanísticas recentes. Esta reflexão surge a propósito da reabilitação do bairro de Nova Sintra, uma obra necessária, mas que continua esta tendência de acinzentar a urbe. Neste projeto foram plantadas algumas árvores, mas são poucas e a sua área está muito restrita.
 
Nas mais recentes reabilitações urbanas, como por exemplo, na proximidade da igreja Matriz, reina um ambiente de impessoalidade e esterilidade. Verdadeiros espaços verdes atualmente são raros na Póvoa, podendo ser contados com os dedos de uma mão: o parque da cidade, um belíssimo espaço amaldiçoado por uma localização periférica inconveniente, cujo acesso é muito difícil para quem não disponha de carro próprio; o jardim situado em frente à escola secundária Rocha Peixoto, com uma localização mais central mas a proximidade da estrada nacional pode tornar este espaço ruidoso e desagradável, para além de ser um espaço pequeno; o jardim na praça do Almada sofre de um problema semelhante embora em menor escala; o jardim da biblioteca municipal, para mim o melhor devido à sua localização, tamanho e ausência de ruído de trânsito automóvel. 

Sou demasiado novo para me recordar dos tempos do jardim no passeio alegre, de uma avenida Mouzinho arborizada e a ideia de um jardim francês na Póvoa onde nasci não passa de um sonho febril. Ainda assim, esta já foi a realidade de muitos poveiros que vieram antes de mim e há muitas fotos que o comprovam a circular nas redes sociais, atraindo sempre comentários como “Eramos felizes e não sabíamos” ou “Como sinto saudades desta Póvoa”. Dito isto, tenho idade suficiente para me lembrar do largo da igreja da Lapa com grandes árvores que forneciam sombra nos dias mais quentes, atraindo miúdos e graúdos que jogavam à bola ou às cartas, respetivamente. Entretanto, esta zona foi esterilizada e acinzentada como muitos outros sítios, perdendo a sua personalidade e afastando todas as faixas etárias nos dias de maior calor.
 
Ainda assim, se há algo que não pode ser criticado é a originalidade destas reabilitações já que, numa altura em que as cidades europeias valorizam cada vez mais a existência de espaços verdes, aqui destroem-se os poucos espaços verdes que existem e implementa-se uma tentativa de brutalismo. Na verdade, isto é incomum porque é uma escolha estética que sacrifica o bem-estar da população. De facto, refiro-me ao bem-estar visto que, mais do que uma mera questão estética, a criação e a manutenção de espaços verdes são medidas de promoção da saúde pública cuja importância é reconhecida pela OMS: “Os espaços verdes urbanos, como parques, parques infantis e áreas verdes residenciais, podem promover a saúde mental e física e reduzir a morbilidade e a mortalidade entre os residentes urbanos, proporcionando relaxamento psicológico e alívio do stress, estimulando a coesão social, apoiando a atividade física e reduzindo a exposição a poluentes do ar, ruído e calor excessivo.” (World Health Organization. Regional Office for Europe. (‎2016)‎. Urban green spaces and health).
  
Porém, criticar é fácil e, apesar de ser importante realçar problemas, é igualmente importante ajudar a construir uma solução. Assim, algumas potenciais soluções para a falta de espaços verdes na cidade poderão passar pela criação de serviços de transporte para o parque da cidade, pela criação de pequenos jardins em espaços como o largo da igreja da Lapa e o passeio alegre e a plantação de árvores em áreas públicas que já possuem relva como ao redor da fortaleza e junto à marina. Tenho a certeza que os poveiros agradeceriam e ficariam mais convictos de que realmente é bom viver aqui. 

António Moreira, estudante de medicina

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