Voz da Póvoa
 
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Jaguaré, nas estórias do meu pai, emigrante no Brasil

Jaguaré, nas estórias do meu pai, emigrante no Brasil

Opinião | 11 Março 2022

Jaguaré, guarda-redes (GR), acompanhou-me a infância nas estórias do meu pai, que não abanara a árvore das patacas no Brasil, para onde emigrou por duas vezes, finais da década de 20 e até 1938, da segunda vez. Carpinteiro, nascido junto ao mar na foz do rio Esteiro, o rio da minha aldeia, Aver-o-Mar, fora para o Brasil depois de “aventura” nas Franças. Pequena reflexão, tardia: por que é que nos interessamos tão tarde, demais, pela história da vida dos nossos pais, avós e outros familiares? São sempre dignas de registo, importantes para o conhecimento do quotidiano dos nossos e da sociedade.

Adepto do remo ( nome completo do clube dos portugueses: Clube de Regatas Vasco da Gama) mais do que do futebol – lendo O negro no futebol brasileiro, apercebo-me da pouca importância do futebol naqueles tempos: “precaução dos organizadores dos primeiros campeonatos de futebol em não marcar jogos nos dias das regatas de remo para não ficarem sem público” – Prefácio à 4ª edição, Luís Fernandes-, dele me ficaram a imagem dum guarda-redes, Jaguaré, que brincava com o avançado ao apanhar a bola, passá-la sobre a sua cabeça e girá-la no dedo indicador.

Já aqui dei nota dum grande jornalista, António Simões: o livro Desporto com Política ganhou prémio e, desde então, leio com agrado a sua contribuição para A Bola. Numa edição recente, eis que aparece o grande Jaguaré – em França conquistou título pelo Olympique de Marselha, onde era chamado Jaguar – e o seu percurso em Portugal.  Giudicelli, Vianinha e Jaguaré foram os primeiros brasileiros a chegarem a Portugal para jogar futebol tendo o GR representado o Sporting na época 35/36 – o grande João Azevedo sucedeu-lhe na guarda das redes – passando ainda pelo Académico do Porto e o Leça no final da década – dados buscados em Fintas Fronteiras – Migrações internas no futebol português – Carlos Manuel Simões Nolasco. Há fotografia de Jaguaré em equipa do Académico.

“Gostava de rodar a “bichinha” na ponta de um dedo, de atirar a “bichinha” na cabeça do jogador mais perigoso do outro time. As mais das vezes não acontecia nada. O jogador do outro time esperando tudo, menos aquilo”.

            “Parando de jogar, Jaguaré voltaria a ser o que tinha sido, a andar de tamancos, toque, toque, um palito espetado num canto da boca. Teria de carregar de novo sacos de farinha para o Moinho Fluminense, de pegar no pesado”.

“Gaguaré e Fausto não jogaram na Espanha… porque não quiseram fazer um pedido de naturalização. Eram brasileiros, não houve dinheiro que os convencesse”- O Negro no Futebol Brasileiro – Mário Filho. Lembram-se  dos pescadores poveiros no Brasil ?

A par de Azevedo, foi a imagem deste GR excêntrico, precursor de Iguita, a povoar os meus sonhos mais longínquos de ser portero, guarda-meta, goleiro, keeper…

 

Abílio Travessas

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