A brisa gelada beijava de leve o rosto d’Ela enquanto emaranhava os seus cabelos e sussurrava desvarios em seus ouvidos.
Sob o manto negro daquela noite sem lua os desassossegos ganhavam a forma de indomáveis corcéis que cavalgavam no interior do seu peito, cortando-lhe o ar.
Seria a Lua Nova em Câncer a razão da hipersensibilidade? A teimar em resgatar memórias de laços rompidos à força, em despertar demónios que as sombras d’Ela já não podiam abraçar?
Mantinha a atenção voltada para a chama violeta que ardia à sua frente, escutava com atenção o crepitar da madeira sagrada e sentia o aroma à alfazema fumada que impregnava o espaço ao seu redor.
Aquele era um fogo que não ardia, mas tinha o propósito de queimar, purificar, transmutar toda a densidade que a fazia afundar dentro de si mesma, sem em si mergulhar.
Abria-lhe os horizontes e os ouvidos à voz interior que tudo sabe, que tudo conhece e que afirma que tudo está onde deve estar.
Sem hesitar, despiu-se das rotas e maltratadas vestes e caminhou sobre as labaredas que percorreram toda a extensão do seu corpo, iluminando-o com um brilho tênue e frio, arrefecendo o calor que a consumia por dentro, controlando a sua respiração, trazendo paz ao coração.
Disse baixinho, para si mesma: “Eu te perdoo.” – era apenas isso que ela desejava escutar, e abriu as pálpebras para contemplar o raiar de outro dia.
Quando o impalpável insiste em assombrar a realidade, Ela encontra, no sonho, a cura para todos os males da alma!
Maria Luiza Alba Pombo