Voz da Póvoa
 
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A propósito de “O Bastos”

A propósito de “O Bastos”

Opinião | 14 Janeiro 2022

O recordar surgiu lendo na revista do Expresso a crónica de Manuel Alberto Valente, O outro lado dos livros, com o título em epígrafe.

Descíamos a Sá da Bandeira para a Baixa coimbrã acompanhados de amigo que convidara o Baptista-Bastos para falar de literatura e do mais que lhe conviesse, numa escola da cidade e, à noite, na saudosa Clepsidra. Nas apresentações, ainda na Praça da República, BB antecipando-se à formalidade: Não diga nada, você tem o BI na cara!; acontecia que eu, de facto, apresentava a face “pro vermelhinho” devido a uma cuperose, distúrbio cutâneo em que os vasos sanguíneos periféricos eram mais visíveis. BB foi “um dos maiores narradores do nosso tempo” na “opinião do insuspeito Jorge de Sena”, citando Manuel Alberto Valente.

Baptista-Bastos é mais um dos nossos escritores, tantos, esquecidos. José Cardoso Pires, testemunho do nosso tempo antes de Abril, José Gomes Ferreira, Augusto Abelaira – a peça de teatro Juventude inquieta baseia-se em A cidade das flores – Torga, Aquilino, sempre com o reparo de difícil, Manuel da Fonseca – Seara de Vento teve um filme de Serge Tréfaut – e outros.

A Praça da República, em Coimbra, foi local de grandes amizades e conversas, depois do jantar; alguns levou-os a lei da vida: Cristóvão de Aguiar, há pouco falecido, escritor açoriano, quem o conhece?, o Aníbal Almeida, professor na Faculdade de Direito mas, não sabendo só de Direito, o ensaio que escreveu sobre o retrato de Camões, tão denso/erudito, é difícil; ainda entre nós, o Carlos Santarém Andrade, amigo de tantos anos, genro do grande mestre de Finanças, já falecido, Teixeira Ribeiro; foi director da Biblioteca Municipal de Coimbra, que lhe deu tempo e material para o ensaio Camilo em Coimbra.

Homens que não aparecem nos meios de comunicação, mais virados para a socielite e notícia de digestão fácil. Há pouco desapareceu um homem, dos mais cultos que conheci, psiquiatra, Lousã Henriques, criador de museu etnográfico na terra onde nasceu. A Lousã e a serra que bem conheci nos tempos em que lá fui professor de Educação Física. De Lousã Henriques tenho a última “aula” na memória, no seu museu, sobre a origem do arado, exemplificando com os espécimes à nossa frente, que foi comprando e armazenando até à exposição no local apropriado. Notícia do seu óbito não encontrei em lado algum. Sic transit gloria mundi.

Abílio Travessas

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