Voz da Póvoa
 
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A baía de San Julian na rota de Magalhães e Drake

A baía de San Julian na rota de Magalhães e Drake

Opinião | 8 Agosto 2022

 

“Os cadafalsos erigidos por Magalhães ainda lançavam uma sombra sobre uma colina e os marinheiros recolhiam ossos espalhados aqui e ali. Talvez pertencessem a Gaspar de Quesada, um amotinado que Magalhães tinha executado neste local”. - Em busca de um reino – Francis Drake, a rainha Isabel I e os alvores do império britânico, Laurence Bergreen, Bertrand editora.

A história repetiu-se com Drake quase seis décadas depois de Magalhães. Em 1520, a passar o inverno austral nesta baía, na Patagónia, Magalhães sofreu o maior desafio à sua liderança. Domingo de Páscoa, o comandante português tinha uma preocupação decisiva: saber quem lhe era leal perante a conspiração latente e cada vez mais agressiva dos castelhanos. “Quando Carlos I (futuro Carlos V) nomeara Cartagena, Mendoza e António de Coca, vedor, tesoureiro e contador, impusera-lhes responsabilidades… Têm de velar pela propriedade real, representada pelos cinco navios…” Palavras de Stefan Zweig a justificar as dúvidas dos castelhanos perante a recusa de Magalhães sobre “o curso da frota e, como mais tarde Cano resumiria no protocolo: que tomase consejo com sus oficiales e que diese la derrota a donde queria ir”.

Nesse domingo de Páscoa Magalhães convida os três capitães, Gaspar Quesada, Luís de Mendoza e António Coca a jantarem juntos. “Sem se darem ao trabalho de inventar uma desculpa, fingem os três capitães não ter ouvido ou ter esquecido o convite do almirante.” A revolta começou com a tomada do Santo António comandado pelo capitão português Álvaro de Mesquita, primo de Magalhães, dando superioridade em número de navios aos espanhóis; o San Antonio fica sob comando de Juan Sebastian del Cano – “Neste momento, é chamado para impedir a realização da ideia de Magalhães; …quererá o destino que ele seja o eleito para concluir a obra do grande almirante”. Fernão de Magalhães – S. Zweig

Magalhães irá actuar com audácia, contra as expectativas mais razoáveis: “empreender alguma coisa de estranhamente perigoso com a mistura máxima de prudência e cálculo; os planos mais temerários de Fernão de Magalhães são sempre como bom aço forjado ao fogo da paixão, mas endurecido ao gelo da calma mais reflexiva”. Zweig

Magalhães domina a revolta. É preciso castigar os revoltosos: Gaspar de Quesada é condenado à morte, executado à espada - e não pelo garrote - pelo seu criado, Luís de Molina, posto perante o perdão se aceitasse …

E Drake? Este pirata ao serviço “oficioso” da rainha virgem também  teve que enfrentar um motim nesta baía. O conspirador, Thomas Doughty, julgado e condenado a 2 de Julho de 1580, foi confrontado com três opções: executado de imediato, largado em terra ou responder em Inglaterra perante o Conselho dos Lordes de Sua Majestade. Escolheu ser executado. Na véspera, Drake e Thomas Doughty jantaram juntos, “tão alegremente como em qualquer momento das suas vidas… cada um animando o outro e brindando um ao outro, como se uma viagem se aproximasse”. – Em busca de um reino.

 

Abílio Travessas

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