Voz da Póvoa
 
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Dar Sangue e a Vida do Outro Receber

Dar Sangue e a Vida do Outro Receber

Local | 27 Maio 2020

Os dadores de sangue são veias solidárias de vida, sem dúvida a maior das dádivas. Sempre que chamados podemos ajudar, mas o dador de sangue fá-lo sem a necessidade do apelo, porque sabe que todos os dias há pessoas que precisam de o receber para regressar à vida.

Foi com o sentido de ajudar na recolha, que nasceu a Associação Humanitária de Dadores de Sangue da Póvoa de Varzim, oficialmente a 8 de Julho de 2005, tendo como madrinha Nossa Senhora das Dores.

Em tempo de pandemia e agora em estado de calamidade fomos conversar com o presidente, Victor Manuel Ribeiro Correia, que nos revelou os dias cautelosos e solidários do trabalho da Associação: “Estivemos parados um mês. Não fomos obrigados, mas tivemos receio. Depois percebemos que não podíamos parar. Os hospitais fizeram apelos e começamos a criar condições para fazer as recolhas todas as semanas. Os dadores aguardam a sua vez e ninguém entra sem máscara e sem ser monitorizada a temperatura. Se tiver mais de 37 graus a enfermeira contacta a ‘Linha Saúde 24’ e aguardamos uma informação válida. Na sede da associação, na Rua Almirante Reis, fazemos quatro recolhas por mês, há uma dezena de anos e nas freguesias também fazemos recolhas mensais”.

E acrescenta: “No início colávamos muitos cartazes a divulgar os locais de recolha. Nas freguesias tínhamos a ajuda dos padres que divulgavam no final das missas. Agora temos um sítio na Internet, Facebook e a plataforma do município. Não posso esquecer a ajuda preciosa dos jornais locais e da rádio, na divulgação dos dias e locais de recolha de sangue”.

O tempo disponível sempre foi ocupado a ajudar, reconhece o presidente: “Quando entrei na Associação, um ano antes entrei na política. Eu vejo a política como uma área social. Sou há ano e meio membro do Rotary Club da Póvoa, onde se ajuda quem mais precisa e merece ser ajudado. Na Associação tenho uma equipa fantástica, mas quem tem mais tempo livre sou eu. Depois de organizar as recolhas de sangue sobra tempo, mas eu gosto de acompanhar. O objectivo da Associação é as recolhas de sangue. E pelo meio festejamos o nosso aniversário, fazemos um jantar de natal e aos dadores que atingem as cinco dádivas de sangue entregamos, como prova de reconhecimento, um diploma”.  

Os Números da Associação que Ajudam a Salvar Vidas

Uma associação desta natureza vai ser sempre necessária. Enquanto houver pessoas com consciência solidária a vida será eterna. Seremos apenas rendidos pelo amor ao próximo. “Começamos com três recolhas anuais e actualmente fazemos cerca de 70. Na associação temos cerca de dois mil dadores registados, mas a média mais activa ronda os 1800 dadores. Temos cerca de 50 dadores por freguesia. No ano passado tivemos cerca de 3000 mil dádivas. Agora também foram formalizadas novas regras pelo Instituto Português do Sangue. São recolhidas até um máximo de 100 dádivas por sessão. Cada pessoa tem 5 litros de sangue e pode dar até 450 mililitros. Algumas horas depois o organismo repõe o sangue. A Póvoa de Varzim é um dos concelhos que está a dar mais sangue na Zona Norte”, revela Vitor Correia.

Todo o dador de sangue vem a pensar no outro. “Dar sangue é dar vida. Um dador tem um seguro e sempre que se desloca para uma recolha de sangue preenche um documento com diversas perguntas. Também fica a saber dos resultados das suas análises e por vezes são sinalizadas doenças que de outra maneira não seriam. A idade para a primeira dádiva é aos 18 anos e pode fazê-lo, se tiver saúde, até aos 65 anos. Se quiser dar sangue pela primeira vez não pode ter mais de 60 anos. Quanto mais velhos mais medicação tomam e isso pode ser impeditivo, mas temos dadores que nunca tiveram problemas de saúde e já deram sangue 60 vezes”, revela Vitor Correia.

E acrescenta: “Há 20 anos atrás eram os homens que mais davam sangue e agora 80 por cento são as mulheres. Tem vindo muita juventude dar sangue, principalmente raparigas. Só na segunda dádiva é que sabe o seu tipo de sangue e aí recebe também o seu cartão de dador. Para ter direito à isenção das taxas moderadoras tem que dar sangue duas vezes por ano. Os homens podem dar sangue em cada três meses e as mulheres em cada quatro meses. Há dadores que já ultrapassaram as 30 dádivas. Que ficam isentos para toda a vida, mas continuam a dar sangue. Vem com o sentido de ajudar os outros mas também a si próprio porque a pessoa anda vigiada e controlada na doença. É também com este sentido solidário que todos os anos fazemos uma caminhada com os dadores de sangue que contribuem com um donativo, que depois é entregue ao Instituto Maria da Paz Varzim”.

Nunca podemos esquecer os outros, temos sempre alguém que precisa de nós: “Vivemos numa roda onde damos e amanhã precisamos. É uma máquina que não pode parar. Todos os dias são gastas 1200 doses de sangue nos hospitais. Nós recolhemos e o Instituto analisa todo o sangue e faz a distribuição pelas necessidades hospitalares. Também fazemos recolha de medula óssea. Neste caso, os dadores tem que ter entre os 18 e os 45 anos. A recolha da amostra pode ser feita ao mesmo tempo que dá sangue. Depois quando alguém precisa e a medula é compatível, a pessoa é contactada”.

Por questões de saúde e segurança, Vitor Correia alerta que há regras a cumprir pelos dadores: “Uma pessoa que faça uma tatuagem tem que esperar quatro meses para poder dar sangue, o mesmo acontece a quem tenha feito uma biopsia. Se tirar um dente espera 15 dias. Há muitas regras e restrições que o dador tem. Os profissionais de saúde ou bombeiros não podem dar sangue, porque tem contacto com pessoas de risco”.

Um Sentido de Ajuda à Vontade de Ajudar

Desde muito jovem Victor Correia participou activamente em várias associações recreativas, culturais e desportivas do concelho, com passagens pelo escutismo, Rancho Poveiro, pelos Bombeiros ou pelo Varzim SC, onde jogou dois anos como sénior. Actualmente é membro dos Rotary Club da Póvoa “Motiva-me o associativismo onde o lado humano e solidário é uma presença, mas a entrada na Associação Humanitária de Dadores de Sangue foi um acaso. Um amigo da Estela procurava colaboradores para integrar uma nova associação, convidou-me e aceitei. A ideia concretizou-se e acabei a promover uma direcção com gente de todas as freguesias. É a única Associação que tem o concelho todo representado. Ninguém ganha nada com isto mas dá do seu tempo. Como sou quem mais disponibilidade tem, assumi a presidência da direcção nos últimos cinco anos. Somos 15 elementos, onze mulheres e quatro homens. Estamos a trabalhar com o Ministério da Saúde que disponibiliza a verba para apoiar a Associação no seu trabalho de promoção e logística”.

Os primeiros passos da associação foram dados nas freguesias: “Começamos a fazer recolhas de sangue nas sedes de junta, nos Centros Paroquiais e Centros de Dia. Sempre com o apoio e colaboração das entidades locais e do município, que tem sido incansável com esta associação. Na cidade chegamos a fazer recolhas nas escolas, frente ao Casino, na meia-laranja, frente ao estádio do Varzim, nas secundárias Rocha Peixoto e Eça de Queiroz, no MAPADI, no quartel dos Bombeiros, nos Leões da Lapa, na Juvenorte, sempre tive o apoio destas instituições”.

Com o correr do tempo aumentou o número de dadores e a necessidade de melhorar as condições de recolha, esclareceu Vitor Correia: “Ao voluntariado juntamos a experiência que nos ensina a perceber as necessidades. Fomos melhorando o trabalho da associação, oferecendo aos dadores e à equipa de profissionais que fazem a recolha, melhores condições. Depois comecei a perceber que na Póvoa bastava encontrar um local para a recolha, porque os dadores eram sempre os mesmos e os novos, a primeira vez, vem quase sempre acompanhados por um dador”.

E recorda: “Um dia vi em Braga um autocarro, na praça frente à Câmara Municipal, a fazer recolhas e fiz o convite ao Instituto Português do Sangue do Porto, liderado pela médica poveira Ofélia Silva, que de pronto nos apoiou. A unidade móvel traz na equipa médico, enfermeiros, administrativos e pessoal para o bar. Com autorização da autarquia poveira, passamos a fazer recolhas na Praça do Almada. Hoje em dia, para além das excelentes condições que temos na sede da associação, também nas freguesias tudo se tornou mais acolhedor. Vem muita gente das freguesias e de concelhos vizinhos, como Vila do Conde, Esposende, Barcelos e Famalicão, dar sangue”.

Vitor Correia na hora de agradecer nunca esquece a cedência gratuita da sede da associação: “Não pagamos renda e isso deve-se ao José Montenegro, uma pessoa com posses, que para além de colaborar com a associação, se dispôs a oferecer este espaço gratuitamente e com todas as condições para fazer as recolhas de sangue. Tem sido um amigo muito importante. Também o Presidente do Município tem ajudado a associação e nunca colocou obstáculos aos nossos pedidos. Não posso deixar de agradecer a todos os directores de escolas, aos presidentes do MAPADI, dos bombeiros e das associações. Com a ajuda de todos ajudamos mais pessoas. Esta marca a diferença no concelho da Póvoa pela humanidade que transporta”.

 

 

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