Voz da Póvoa
 
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Beneficente Quer Continuar a Combater as Carências Sociais

Beneficente Quer Continuar a Combater as Carências Sociais

Geral | 5 Maio 2021

Correm os anos e sabemos o quanto correm, quanto mais maduros somos. Para que o futuro nos possa surpreender temos que do passado buscar todo o ensinamento. Em 1906, um grupo de poveiros designado ‘Companheiros do Bem’ fundou na Póvoa de Varzim, A Beneficente, uma Associação de Solidariedade Social, sem fins lucrativos. Na sua longa existência, destaca-se o apoio aos mais carenciados, mas a sua actividade e serviço, abriu os braços à vertente educacional de crianças e jovens, não deixando nunca de cumprir os ideais dos fundadores.

O trabalho social desta instituição é hoje, reconhecido por todos os poveiros, mas quisemos saber o seu dia-a-dia nas palavras do Presidente, Dr. Rui António Lima Quintas, um poveiro nascido em 1960.

“A instituição após o 25 de Abril de 1974 viveu os problemas que se passaram com o processo revolucionário. Quando o meu pai António Quintas entrou, atravessava um período menos bom, mas o seu dinamismo tornou A Beneficente nesta grandeza que é hoje, com um conjunto de serviços e equipamentos notáveis, reconhecidamente uma das maiores instituições da Póvoa. Nos últimos anos em que o meu pai foi presidente, integrei a direcção como Vogal. Quando a idade deixou de permitir continuar de corpo inteiro, falou-me se estaria na disposição de o substituir. No fundo foi este carinho passado pelo meu pai que me tocou. A forma como ele desenvolveu o seu trabalho na instituição, o carinho, os valores e a entrega que conseguiu passar, senti que havia da minha parte um sentido de responsabilidade e aceitei assumir a direcção”, recorda.
 
O fim nobre que a instituição defende e pratica: “A direcção, esta e qualquer outra que por aqui passou, está cá por carolice, sem qualquer tipo de remuneração, tal como a lei e os estatutos definem. Além disso, tem que haver alguém que se disponibilize, porque se cedem muitas horas da nossa vida para servir a instituição, apesar de termos quadros e equipas excelentes que fazem o trabalho acontecer. Por isso, é importante rejuvenescer as instituições desta natureza”.

A Beneficente faz um longo caminho de intervenção social que nas últimas décadas se multiplicou: “Começou por apoiar os mais carenciados. Tinha a sua cantina social, o balneário ou as lavandarias. A sua sustentabilidade dependia praticamente de apoios estatais ou da sociedade civil. O grande salto acontece com o alargamento à área educacional, quando começa a investir nos Jardins de Infância, nas Creches e no ATL. Esse grande impulso permitiu criar um balanço entre a área social e a área educacional. A instituição ao alargar o âmbito da sua actividade, ganhou melhores condições de sustentabilidade e ao mesmo tempo capacidade que lhe permite não estar totalmente dependente dos apoios estatais e municipais. Conseguimos gerar receita que permite à Beneficente desenvolver-se de forma mais autónoma. Depois, a abertura à área educacional promoveu a imagem e ajudou na proximidade com a população”.

Rui Quintas esclarece que as infraestruturas e valências criadas não se desviam da área social: “Na parte educacional, os nossos Jardins também recebem crianças de famílias carenciadas. A instituição está aberta a todos. Quem tem poder económico e pretende os nossos serviços, pode procurar-nos também. Há um limite, um valor de tabela, mas quem não tiver condições económicas, paga de acordo com os seus rendimentos do agregado familiar, ninguém é excluído”.
 
E acrescenta: “Temos parcerias com a CPCJ – Comissão de Protecção de Crianças e Jovens, em que A Beneficente, conjuntamente com a rede social da Câmara Municipal, faz o acompanhamento de crianças em famílias de acolhimento. São Técnicas especializadas que fazem esse apoio de integração e desenvolvimento. Muitas crianças estão integradas dentro da própria instituição. Na área social temos o apoio domiciliário, mas também o Rendimento Social de Inserção”.

O crescimento da instituição obrigou a alargar a equipa de profissionais: “exceptuando a direcção, todos os quadros são remunerados e temos contratos de trabalho, dentro daquilo que a legislação exige. Procuramos pessoas qualificadas e profissionais para cada uma das valências dos diversos serviços que prestamos. Hoje, temos a área social que é composta por Centro de Dia, pelo apoio ao domiciliário, por um balneário, uma lavandaria, um refeitório social, que serve 600 refeições diárias. Depois, temos a parte educacional com Creches, Jardim-de-infância e ATL, com os baptismos de Pires Quesado, Santo António e a creche Nossa Senhora da Conceição. Procuramos melhorar cada vez mais, aprendendo com a realidade. Actualmente, andamos num horizonte que rondará os 150 funcionários, um número significativo. O orçamento anual tem algum peso na estrutura, porque não é só funcionários, mas também a manutenção de um conjunto de equipamentos, viaturas para apoio domiciliário, quer de refeições, higiene pessoal ou limpezas da casa de quem assistimos”.

A Requalificação da Sede Está no Horizonte d’A Beneficente

“Ao longo dos anos assumimos prioridades. Primeiro, fizemos uma intervenção na área social, nos edifícios jardim-de-infância e creches, hoje, continuamos a fazer a sua manutenção e conservação. No edifício Sede, tivemos que passar o Centro de Dia de uma cave para o 1.º andar, uma intervenção que obrigou a colocar um elevador exterior. Hoje, queremos dar uma certa dignidade ao edifício, em consonância com as obras que a Câmara fez no exterior, nos arruamentos. Queremos uniformizar o edifício ao nível da pintura no exterior, porque temos uma parte antiga e uma moderna, mas também criar mais gabinetes. Estamos a trabalhar na procura de apoios, sabendo que a filosofia da Beneficente é delinear o objectivo e traçar o que pretendemos. Fizemos o levantamento das necessidades da recuperação do edifício e agora vamos à luta para angariar os apoios financeiros necessário para que a obra se concretize”.

Para Rui Quintas o objectivo é atacar as prioridades, os sonhos do amanhã têm que aguardar por melhores dias: “Há alguns anos atrás, tínhamos perspectivas de crescimento, porque pretendíamos avançar com projectos já planeados. Em 2020, quando esta direcção tomou posse, na primeira reunião traçámos projectos, objectivos e ideias que pretendíamos desenvolver. A partir de Março, tivemos que parar os sonhos. Neste momento, sabemos que a economia está numa fase muito complicada, as famílias estão a passar uma crise social. O problema não é só nacional, mas internacional. Agora temos que ser mais cautelosos. Os projectos existem, mas temos que dar passos seguros, com sentido de responsabilidade e consistência. A sustentabilidade da Beneficente, apesar de ter alguma, depende muito de apoios. Hoje, o Estado ou a própria autarquia tem muitas solicitações e não é só das instituições. Temos que ser mais cautelosos e saber reajustar prioridades. Neste momento, o nosso objectivo é manter a qualidade e prestar os serviços que temos presentemente. Dias melhores virão, aí poderemos abrir o tal caderno onde desenhámos os nossos objectivos e o caminho a seguir”.

Para o presidente d’A Beneficente a pandemia levou a uma maior cooperação com a Câmara Municipal: “Para continuar a apoiar pessoas necessitadas, tivemos todos que nos reinventar em segurança e ser imaginativos. Depois, dialogar com os outros parceiros que estão no terreno, como a Câmara Municipal, a Direcção-Geral da Saúde e os nossos delegados locais. Tivemos alguns funcionários infectados e em quarentena, mas procuramos sempre encontrar as melhores soluções. Fizemos um investimento grande na compra dos equipamentos de protecção individual. Desde o início da pandemia, dissemos que não pouparíamos em prejuízo da segurança. O bem-estar dos nossos funcionários teria que ser prioritário para criar nos nossos utentes uma certa tranquilidade. A Câmara também nos ajudou na aquisição e até na oferta desses equipamentos de protecção individual, tais como máscaras, batas, luvas, ou álcool-gel. Comprámos tudo o que era necessário para poder continuar a dar apoio às pessoas que nos procuram. Na cantina social, tivemos que entregar ao domicílio ou à porta da instituição. Para as pessoas que não tinham qualquer tipo de retaguarda tivemos que equacionar a hipótese de comerem na nossa cantina”.

As Melhores Respostas Para Ultrapassar as Dificuldades
 
Rui Quintas enalteceu a capacidade das equipas que prestaram apoio a todas as solicitações: “Procurámos sempre estar atentos aos sinais da doença, mas também fizemos testes de despistagem. Houve preocupação e muito rigor. Conseguimos prestar todo o apoio com consequências mínimas. O Centro de Dia deixou de funcionar, as pessoas ficaram em casa, mas nós fomos fazendo as visitas de apoio, na alimentação ou na medicação. Não foi fácil, mas tivemos funcionárias de grande valor, de grande garra, que não tiveram medo em correr riscos. Daí, termos investido em equipamentos de protecção individual sem olhar a despesas. Houve muita cautela, é possível que nem tudo tenha sido perfeito, mesmo ao nível do serviço, mas tentámos fazer sempre o melhor que podíamos e que as circunstâncias permitiam. Com as sucessivas vagas e confinamentos, a situação social agravou-se e, tivemos que socorrer muito mais famílias. Fizemos das tripas coração para responder a todos e ultrapassar as dificuldades, mesmo internas, para não deixar ninguém de fora. Queremos que os apoios que damos na instituição ou ao domicílio sejam para ajudar as pessoas a recuperar a sua dignidade. Esse serviço prestado tem sido reconhecido e há sempre quem volte à sua vida e nos agradeça o apoio prestado em determinado momento”.

Os apoios do Estado nunca são suficientes, mas o poveiro é um campeão solidário: “A Segurança Social e a Autarquia apoiam-nos. Temos também apoio do Banco Alimentar, alguns produtos que nos permitem confeccionar e reduzir custos. Recebemos também algum apoio das empresas locais e na época do Natal, a onda solidária cresce, com as pessoas a fazerem os seus donativos e entregas de bens essenciais. A população da Póvoa tem tratado bem a Beneficente, compreendendo esta questão do apoio social e só temos que saber agradecer. Sabemos que não chega para as nossas necessidades, por isso, criámos infraestruturas para a sustentabilidade da instituição”.

A área educacional também sofreu com as restrições delegadas pelo Governo e pela Direcção-Geral da Saúde, recorda Rui Quintas: “Ao longo deste tempo todo, fomos reajustando os nossos serviços às orientações dadas pelo Governo. Quando tivemos que fechar as creches e infantários fizemos todo aquele trabalho à distância, dentro das limitações que nos eram impostas pelas autoridades. Claro que as festas da Páscoa, de Natal e fim de ano não se realizaram como era habitual. Optámos por fazer coisas bem mais simples e à distância. As crianças entenderam, porque em casa viviam o problema em família, tal como nós. Sabemos que entre as crianças, o contacto físico, o afecto é uma normalidade absoluta e compreender o contrário nunca é fácil. Todos tivemos que fazer um esforço no sentido de combater esta pandemia, claro que tivemos e pass´smos por situações frustrantes, como não fazer estas festas com as crianças e com as suas famílias, mas o rigor exigia, para bem de todos. Fizemos aquilo que era possível fazer, para que as crianças sentissem de alguma forma o Natal ou a Páscoa”. 

Liderar uma Instituição Centenária é Honrar o Passado

A vida de uma instituição centenária precisa de um coração a bater por ela: “Sinto uma grande responsabilidade em cima dos ombros e no momento que estamos a atravessar, essas responsabilidades aumentaram, porque a preocupação é grande, não só pelos serviços que prestamos, mas pela manutenção da sua quantidade. Depois, há sempre aquela preocupação para com os nossos utentes e funcionários que os atendem e apoiam. As minhas comunicações internas foram sempre no sentido de dar alento para que não perdessem a força, que tinham que prestar este apoio social, mas nós ouvíamos as notícias e o medo que acontecesse na Beneficente o que se passou em algumas instituições, preocupava. Não estávamos isentos disso e havia sempre o risco de encerrar serviços. Felizmente, isso nunca aconteceu. Claro que uma instituição centenária, conhecida e reconhecida no seu trabalho, com a dimensão que tem, a responsabilidade cada vez é maior. E à medida que avança e os projectos se concretizam, a responsabilidade aumenta. Mas, também é um orgulho para esta equipa, direcção e funcionários, demonstrar à comunidade poveira que conseguimos vencer até à data, esta pandemia. Isto dá-nos alento para continuar”.

Rui Quintas reconhece que ninguém consegue nada sozinho e deixa uma mensagem aos poveiros: “Quero que todos se lembrem da Beneficente, que é uma instituição de solidariedade social, que existe para apoiar as pessoas mais carenciadas, uma realidade que todos temos que combater, no sentido de recuperar a dignidade dessas pessoas. Sempre que possam contribuir e ajudar a instituição, agradecemos porque é com essa ajuda e esse apoio que conseguimos prestar um serviço melhor e atenuamos o sofrimento às pessoas. Uma pequena ajuda, para nós é gratificante e significativa, porque todos juntos somos muitos. A instituição para chegar e apoiar mais gente, precisa de meios. Quem puder contribuir e ajudar esta instituição, está a ser solidário com todos aqueles que mais necessitam”.

Por: José Peixoto

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