Voz da Póvoa
 
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A Casa dos Livros é na Norprint

A Casa dos Livros é na Norprint

Geral | 17 Agosto 2020

Habituamo-nos a ver as empresas, a decorar-lhes o nome, mas os empresários nascem primeiro, fruto de uma maturação da aprendizagem que, o futuro quer contínua e actualizada. Dessa forma, as empresas convencem com a qualidade do seu produto, assumem-se no mercado, crescem, ultrapassam fronteiras e impõem uma marca.

A Norprint – Artes Gráficas, S.A. habita actualmente a Zona Industrial Alto da Cruz, em Santo Tirso, e deu-se como fundada em 1992. Hoje, labora com mais de 70 colaboradores e produz com tecnologia de ponta, mas os primeiros passos foram dados num escritório, no Porto, por Três pessoas.

“É uma história engraçada. Concluída a 4ª classe fui trabalhador estudante até me licenciar em Gestão. Os meus pais abriram o Restaurante Farol, onde, desde os 10 anos fui ajudante de cozinha, do Chefe Domingos, mas fiz um pouco de tudo em hotelaria. Depois, trabalhei na fábrica de chocolates em Vila do Conde. Mais tarde, a escola colocou-me na Shell, na área Logística e, desta multinacional saí para as Edições ASA. Aí sim, tive contacto com os livros. Fui trabalhar para a parte gráfica, uma das maiores do país. Entrei como Director Comercial e mais tarde assumi a produção e o cargo de Director Geral. Quando saí da ASA criei, com mais duas pessoas, a Norprint, num escritório no Porto”, recorda José Manuel Lopes de Castro, que entre outros cargos, é presidente da Associação da Indústria Gráfica em Portugal e Vice-presidente dos Cavaleiros de Gutenberg.

O empresário que nasceu na Póvoa de Varzim, em 1957, reconhece que o crescimento da empresa se deve a uma constante renovação da tecnologia: “A Norprint é uma empresa com tecnologia de ponta. Adaptamos algumas máquinas que apenas imprimiam, a fazer outras operações, de resto grande parte da maquinaria é recente. Temos máquinas que entraram na semana passada, outras há um mês, dois meses. Temos tecnologia de ponta e procuramos sempre comprar equipamento novo”.

A tecnologia é imparável, mas o receio que o livro acabe em papel deixou de existir: “Já foi mais verdade e já houve mais medo, mas agora as coisas são diferentes. Ao reinventar o livro travamos a sua extinção. Se estivermos atentos, os livros escolares da Porto Editora já têm a realidade aumentada. O aluno pode pegar no telemóvel e ver vídeos através do seu livro escolar. Já fizemos livros com cheiros a morango, a chocolate, a baunilha, livros que permitem ter acesso a links de informação, tudo isso se faz. Não temos ilusões de que é um sector em crescimento, mas tenho sérias dúvidas que o culpado seja o E-book (livro electrónico). Tenho mais medo do corte no poder de compra que uma crise destas provoca, que obriga as pessoas a gerirem muito bem o seu orçamento e nessa altura o livro, infelizmente, não é um bem essencial. De resto, já concluímos que vamos conviver com o papel e o electrónico. Uma empresa também não se limita ao mercado nacional. Produzimos para vários países europeus e há muitos anos que faço Africa regularmente, com diferentes projectos, mas na génese sempre do livro, temos uma presença muito forte em Angola, menos em Moçambique, Guiné, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe. Também fazemos para o mercado brasileiro, menos do que gostaríamos. Vencer fronteiras faz parte da cultura da Norprint”.

Dar um passeio pela memória gráfica do passado, para Lopes de Castro é viver uma rápida evolução: “Na minha vivência de gráfico isto teve verdadeiras revoluções, claro que fomos sempre nos adaptando. O sector gráfico absorveu desde sempre a digitalização e em primeira linha. A digitalização nunca preocupou. Aliás, melhorou bastante a nossa relação com o produto, com o cliente, com o fornecedor, sempre nos soubemos adaptar. É claro que, fui vendo máquinas a desaparecer completamente, mas também funções e operações. O retocador e o montador são duas profissões que já não existem. Fui assistindo, sendo actor deste filme até aos dias de hoje. Vivemos uma transição do analógico para o digital e a Norprint está no bom caminho. A Póvoa nesta transição perdeu muitas e importantes gráficas, mas não nos podemos esquecer que temos uma unidade na Póvoa com muito prestígio, a RCM etiquetas”.

Acorrentado aos Livros deu Asas ao Correntes d’Escritas

Para quem produz livros e lida com autores é inevitável falar do Correntes d’Escritas. Talvez não saiba mas, Lopes de Castro, sem imaginar o futuro do evento literário não deixou de estar ligado ao seu passado: “O Correntes d’Escritas é um projecto que nasce com o Francisco Guedes e, numa conversa percebi que o queria levar para Matosinhos. Somos amigos há muitos anos e pedi-lhe calma – isso vai é para a Póvoa – a costela poveira a falar. Ainda bem e em boa hora, a única coisa que fiz foi, levá-lo à Póvoa para falar com o Luís Diamantino, Vereador da Cultura. Depois, o mérito é da Câmara Municipal e da Manuela Ribeiro, que puseram de pé o Correntes d’Escritas, estes anos todos. Desde a primeira hora, somos patrocinadores do evento”.

Quanto à relação com autores e editores, vem desde o tempo da ASA, mas o empresário reconhece que, “naturalmente, com o Correntes d’Escritas cresceu. É uma relação que privilegia o convívio directo com o autor, tem essa particularidade. Depois, houve um Correntes d’Escritas, nos primeiros anos, que foi feito dentro das instalações da Norprint. Organizamos a empresa para receber o evento e hoje somos uma marca ‘A Casa do Livro’ registada no dia seguinte à presença do Correntes d’Escritas. Na mesa dos autores estava a Lídia Jorge que se referiu ao lugar dizendo: Sinto-me na casa do livro. Por isso agradeço a referência à escritora. Na verdade, nós respiramos o livro. Fazemos muita coisa, mas no essencial é livros. Por isso, esta marca ‘A Casa do Livro’ é oportuna e damos bom uso ao nome”.

Entre outras, Lopes de Castro ‘produz’ as revistas Correntes d’Escritas e a Egoísta: “São revistas diferentes que apostam na cultura. A revista Egoísta, propriedade do Casino da Póvoa, é um produto de excelência, que já venceu muitos prémios. Mas, nós produzimos, o mérito se lhe podemos chamar assim, é de quem está na concepção gráfica, que não é da nossa responsabilidade. Nós produzimos a partir de ficheiros digitais que nos enviam. Orgulho-me muito da Norpint estar no projecto Egoísta desde o momento zero. Não é só o conteúdo, mas a qualidade. Dá-me gozo”.

Se fosse possível fazer uma biblioteca dos livros que foram produzidos pela Norprint o edifício seria enorme: “Somos obrigados a enviar para a Biblioteca Nacional 14 exemplares de tudo o que fazemos. Procuramos guardar, temos muito espaço ocupado com esses livros. Vamos ver se um dia conseguimos criar uma espécie de biblioteca, a nossa. Temos que estudar a melhor maneira para evoluirmos para outro espaço que estamos a precisar. De momento não, mas num edifício futuro que viremos a construir, vamos de certeza pensar nisso”.

Um Olhar Sobre o Futuro sem Querer Adivinhar

“Posso arriscar alguma coisa. Queremos continuar neste sector, mas estamos a pensar como diversificar. Este sector não se limita ao livro. A empresa do livro é uma coisa, de rótulos e etiquetas é outra. Há empresas de caixas, impressão de jornal ou de brindes. Há muitos subsectores no nosso sector, indústria gráfica. E nós estamos seriamente a pensar diversificar. Ainda não tomamos decisões. Não vamos deixar cair este sector dos livros, esta é a nossa matriz, mas estamos a pensar seriamente em diversificar ou por aquisição ou por investimento”, revela Lopes de Castro.

A tecnologia não retirou a arte ao livro: “Isto envolve muita gente. Quando pegamos num livro temos que perceber que está um autor por trás, um ilustrador ou fotografo. Depois, há um designer. Há todo um conjunto de saberes e competências num livro. Obviamente, não podemos esquecer o editor, o livreiro, a gráfica. Nós temos uma relação directa com os autores que vêm acompanhar o trabalho. Dentro deste fazer, criamos há pouco tempo uma editora de livros de museus, de instituições, um trabalho muito específico. É um diálogo quase obrigatório que temos com a Direcção-Geral da Cultura. Na editora ‘Blue book’ tenho acolhido de bom grado e com muito gosto alguns autores amigos. O meu amigo Meira Fernandes já editou dois livros connosco. Outro projecto editado foi o livro de poesia ‘Pitões das Júnias’ do meu amigo Aurelino Costa, mas há muitos mais projectos em carteira. Eu próprio estou a produzir dois livros”.

A história do Varzim é o mote para Lopes de Castro, desta vez, juntar ao papel de editor o de escritor: “Sou poveiro, instalei-me no Porto, mas tenho casa e família na Póvoa. Em 1962 o meu pai António Fernandes Castro produziu e realizou um filme sobre a Póvoa do Mar. Ele deixou esse legado à Póvoa. Foi esse filme que me levou ao estádio do Varzim e pretendo fazer um livro sobre a história do Varzim, que vai funcionar como complemento ao livro editado no centenário do clube. Procuro dentro da história do Varzim, contar histórias de pessoas que poderão estar esquecidas. É uma outra perspectiva. É um livro que coordeno e tenho pessoas comigo a trabalhar. Um outro desafio é contar a história do Varzim em banda desenhada. É um livro que já devia estar produzido. Embora o texto esteja escrito, as ilustrações seriam feitas pelo Nando Gonçalves e, infelizmente já não deu tempo. Agora temos que arranjar um novo ilustrador. Este livro em banda desenhada, sobre a Varzim vai ter também alguma história local. O Diana Bar e quem o frequentava, os nossos lobos-do-mar, o Eça de Queiroz ou a passagem de Vila a Cidade. Recordo que em 1986 desafiei o jornalista Manuel Dias, a fazer comigo o livro ‘Lobos-do-Mar, que depois produzi”.

Às vezes amamos o livro mais que o autor. “É um produto que nós tocamos e gostamos, do toque sensorial, mas também do que vemos. Falando da empresa e não em termos particulares, esse é o contributo que a Norprint dá aos seus parceiros, que é aquilo que chamamos aconselhamento. A escolha do papel, o formato, a capa. Esta é uma componente importante da empresa. É a relação que temos com os produtos, depois, sim, vem a produção”, esclarece Lopes de Castro.
Quanto às encomendas para ontem acrescenta: “Como trabalhamos 24 horas por dia, temos uma capacidade instalada que poucas empresas no país têm. Não é bom entrarem aqui muitas urgências, de hoje para amanhã, mas já aconteceu algumas vezes, entrar hoje para hoje. Isso obriga a alterar o planeamento, que é feito para a semana e até para o mês. Quando entram urgências, baralha tudo, mas se for necessário e a razão for grande, cá estamos para atender. Temos esta capacidade e usamos quando é necessário. Agora, não podemos abusar”.

A Póvoa e o Varzim ou os dois Amores para Compreender

Lopes de Castro tem dois amores, a Póvoa e o Varzim, uma paixão que não se explica: “Eu com 4 anos já via o Varzim porque o meu pai andava por lá a filmar. Depois, apanhei um período fantástico do clube poveiro na 1ª divisão, com jogos frente ao FC do Porto, Sporting e Benfica. Nos anos 80 fui Vice-presidente do Lídio Marques, e com o meu irmão. Fiz também parte da Comissão Administrativa com Lídio Marques. Antes de ser Presidente, já tinha muito Varzim, muito tempo de dirigente. Hoje, vou muito menos ao futebol, profissionalmente a vida não o permite, mas também estou numa fase em que não sei se gosto de futebol. Uma coisa eu sei, gosto do Varzim e da Póvoa, onde tenho muitos amigos”.
 
Nos mandatos como presidente do Varzim, não tem dúvidas que defendeu sempre os superiores interesses do clube: “Houve momentos desagradáveis no meu último mandato, infelizmente, mas para proteger o Varzim ainda é cedo para falarmos sobre isso. Mas, quem fez mal, se pensa que o fez a mim está enganado. Ao Varzim, sim. Estou de consciência tranquila, dei o meu melhor, fiz excelentes negócios para o Varzim, por exemplo o negócio do Estádio. As pessoas não querem falar disso porque têm que falar em mim. Fiz o negócio com muito orgulho, eu e as pessoas que estavam comigo. Fui eu que comprei a Quinta da Silveira, 54 mil metros quadrados que são hoje propriedade do Varzim. Depois disso, fui obrigado a escrever um texto a dizer, a alertar - atenção que eu não vendi nada. Eu só comprei e aumentei ao património, não vendi o Estádio. Não gostei do que ouvi! Estou zangado? não. Há muita gente que sabe do que falo. Não preciso dar-lhes explicação nenhuma porque eles sabem o que se passou. Quem pensa que fiz alguma coisa que prejudicasse o Varzim pode continuar a pensar, porque não vou perder tempo a explicar nada. Foi um momento no Varzim, desagradável! Foi. Correu mal! Correu. Vale a pena falar dele agora? Não, porque vai abrir feridas muito desagradáveis dentro do Varzim. Querem que eu seja o mau da fita, não há problema nenhum”.

Quanto ao futuro do clube poveiro, Lopes de Castro acredita que acabará por sorrir: “Acima de tudo sou varzinista e tenho a convicção que o clube vai seguir o seu caminho de glória. Conheço pessoas que fizeram o que eu fiz e, por isso acredito no futuro do Varzim. Tenho três netos e, no dia do seu nascimento inscrevi-os como sócios do Varzim, ainda nem sequer eram cidadãos. O cartão de cidadão veio depois. Conheço muita gente que fez o mesmo e por isso acredito no futuro do Varzim. Acredito que virá gente boa ao leme. É uma instituição que vai ter muitos anos de vida. Tal como a história do Varzim em livro não tem um fim. Alguém virá para lhe dar continuidade".

por: José Peixoto

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