É verão de São Martinho!
Pensava ela enquanto lanhava um punhado de castanhas para levar à festa dada pela escola da filha.
O cheiro adocicado já se espalhava no ar e trazia à memória o veranico de maio, típico do seu pago, ainda que sem as castanhas.
Na baixa de Lisboa, sob uma cortina do denso e perfumado fumo que se espalhava pelas ruas, ela provara, pela primeira vez, dessa típica iguaria da época, há dezassete longos anos atrás.
Dezassete anos que mais pareciam uma vida, diga-se de passagem, e, pensando bem, eram mesmo!
Vendo-se hoje ao espelho, pouca coisa sobrara da estabanada guria que cruzou os mares de lá, para cá.
Não fosse pelo seu cabelo azul e trajes pouco convencionais, muita gente, atualmente, já não a reconheceria!
É facto verídico que ela ainda carrega o mesmo brilho no olhar e a mesma fé na vida que trouxera do seu rincão, mas junto disso reuniu por essas terras uma coleção de experiências de fazer qualquer mortal desacreditar.
Deu de beber a Iemanjá e alimentou as tempestades de Iansã, foi escudo para Ogum e balança para Xangô e sobreviveu ao caos que, muitas vezes, ela mesma espalhara pelo caminho.
Hoje Ela é calmaria.
É a certeza de que tudo está onde deveria estar, e tudo acontece como deve acontecer.
Deixa-se balançar quando o vento sopra forte e sabe que não cairá, aguenta a chuva forte lhe bater na espalda e sabe que não se afogará, sente o desamor arder no peito e sabe que não se queimará…
Entende que cá estamos pela experiência, e não se furta de experienciar, de aprender, de edificar a paz que só se dá quando somos senhores do nosso próprio inferno!
Amadureceu no chão, para não apodrecer no pé!
Maria Beck Pombo