É chegada a hora da partida.
A bagagem não abarca apenas objectos, mas também tudo o que não é palpável, mas é essencial.
Leva também uma saudade arredia que às vezes desperta, deixando-se verter através dos olhos, para o mundo exterior.
Essa carta não deveria ser sobre tristezas, pois, para além desse continente, do outro lado do Atlântico, a alegria brota em terra fértil e a certeza da concretização dos sonhos verdeja.
Mas se não for para exorcizar as penas, não vale a pena escrever.
E, nesse momento, é necessário visitar essa campa vazia onde os rotos planos repousam, e deitar uma derradeira lágrima ao chão.
Isso não é sobre perder, é sobre o perigo de idealizar, já que a perfeição não se aplica à realidade.
Eu não pude ser a “mãe fofinha de pijama” a abdicar da vastidão da minha essência para representar o único papel maternal.
E tu não eras um pedaço aprimorado de mim mesma e jamais foste culpado da minha escolha de esconder as tuas sombras, de forma a brilhares mais do que deverias, aos meus olhos.
Magoados, os dois, saímos pelo egoísmo que me fazia pintar-te outra pessoa e a ti desejar o que eu não era, nessa eterna ilusão arquetípica da mãe que tudo oferece e do filho que retribui.
Agora, nessa despedida sem adeus, em que os olhos não se cruzam e negados são os abraços, deixo a culpa e levo apenas o amor.
Mas não o amor egocêntrico que anseia, para mim, o teu retorno, e sim o amor desprendido, desapegado da tua presença, aquele que apenas deseja que abençoados sejam os teus caminhos e que sejas feliz. Aquele que respeita o teu modo de ver a vida e retira de ti o peso de ser o que eu queria que fosses.
A mais dura lição da maternidade é aprender que os filhos não vêm de nós e sim através de nós e apenas ao mundo pertencem!
Maria Beck Pombo, escritora