Voz da Póvoa
 
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tinha uma pedra "No Meio do Caminho"

tinha uma pedra "No Meio do Caminho"

Cultura | 14 Junho 2020

Às vezes precisamos perceber que uma pedra no meio do caminho não faz a calçada, mas pode dar início a uma intifada…

No Meio do Caminho


No meio do caminho tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
Tinha uma pedra
No meio do caminho tinha uma pedra

Nunca me esquecerei desse acontecimento
Na vida de minhas retinas tão fatigadas
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
Tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra


Carlos Drummond de Andrade
 In Alguma Poesia
 Ed. Pindorama, 1930


"No meio do caminho" é o que se pode chamar de poema-escândalo. Publicado pela primeira vez na modernista Revista de Antropofagia, em 1928, deflagrou uma saraivada de críticas na imprensa. “A pedra tinha atingido a cabeça de alguns”.

Em 1930, quando lançou Alguma Poesia, seu livro de estreia, "No meio do caminho" foi incluído no volume.

 Violentos, irônicos, corrosivos, os críticos simplesmente desancavam o autor dos versos e diziam, em suma, que aquilo não era poesia.

 Reacionários e gramatiqueiros sentiam-se provocados pelas repetições do poema e pelo "tinha uma pedra" em lugar de "havia uma pedra".

 Em 1967, para marcar os 40 anos do poema, Drummond reuniu o extenso material publicado sobre ele no volume Uma Pedra no Meio do Caminho -- Biografia de um Poema (Editora do Autor). 

 Vale aqui fazer apenas uma pergunta. Havia milhares de poemas modernistas que a crítica conservadora achava ruim ou desqualificava como literatura.

Porque, então, detonaram todas as suas baterias contra a pedra no caminho?

 Seria talvez pelo facto de que Drummond — o mais completo modernista — pôs realmente o dedo na ferida e incomodava mais?

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