Voz da Póvoa
 
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Parece um pássaro, mas é um pirilampo ou um louva-a-deus

Parece um pássaro, mas é um pirilampo ou um louva-a-deus

Cultura | 10 Março 2022

Assaltam-me imagens de um outro título, de um outro escrito de Valter Hugo Mãe: “O desenho, ou o poema, ensaiam uma captura da verdade, do futuro, do segredo. Ensaiam o reduto de Deus.”
 
Na verdade, ‘Parece um pássaro, mas é um pirilampo ou um louva-a-deus’ e tem uma explicação: “O primeiro era o bicho que eu achava mais incrível à face da terra e o seguro é o bicho do qual eu mais tenho medo. Hoje, acho que me daria melhor com um leão do que com um louva-a-deus”.

Pode parecer estranho, mas estes desenhos são “o ‘Contra Mim’ pregado ou pendurado em pregos nas paredes, este é o meu livro e de alguma forma a minha infância que era feita do fascínio e do assombro. Do fascínio do medo com os pirilampos e com o louva-a-deus”.

Publicado em 2020, ‘Contra Mim’ é um romance autobiográfico que “escrevi a partir de textos que foram escritos ao longo de 15 anos, mas no embate da pandemia vi-me trancado com a minha mãe, em casa dela”. E para poder ser feliz na loucura, Valter Hugo Mãe usou a memória: “Foi um exercício de intensidade, trancados como estávamos, tudo era intenso, e estes desenhos foram feitos a acompanhar o livro nos tempos em que por algum motivo o texto não surgia e eu precisava de esperar por ele, precisava aclarar a memória”.
 
O autor revelou que os desenhos lhe parecem incompletos porque do silêncio surgia uma palavra que os interrompia, mas guardou-os pela razão dos dias: “Para mim eles não têm palavras, mas são um diário. Eu vejo aquele tempo nos desenhos, são aqueles dias e habituei-me a pensar neles até como íntimos. Parece que estou um bocadinho nu nestes desenhos, efectivamente foram feitos num parto do meu quarto”. 
  
A exposição nasceu de um convite e concretizou-se porque “quando o Tomás me coloca esta hipótese, eu quis muito estar aqui. É uma forma de dizer que estarei sempre com as Correntes de algum modo, nem que me coloque em risco, estou sempre a colocar-me, nem que vocês possam achar que os meus desenhos são uma porcaria, eu quis estar aqui, quis mostrar nas Correntes alguma coisa que nunca ninguém viu e quis explicar nas Correntes um livro meu, dum modo que nunca foi explicado em outro lugar. Honra-me muito que as Correntes me recebam, que a Póvoa me receba”.

Tomás Carneiro entende que “a arte é sempre um instrumento do Ser humano em que são expostos valores que fazem aprimorar as nossas emoções, concretizando pensamentos de forma ordenada e dividindo por linguagens: visual, literária, dança e a música. Assim surge o MIAC Póvoa, um projecto que pretende criar um Museu Internacional de Arte Contemporânea na Póvoa de Varzim. Quis o destino que a primeira realização desse projecto fosse no Correntes d’Escritas com esta exposição de Valter Hugo Mãe”. E concluiu agradecendo, “ao Dr. Luís Diamantino pela forma excepcional como acolheu e abraçou comigo este projecto. À Dr.ª Manuel Ribeiro pela forma como integrou a minha ideia no festival Correntes d’Escritas”.

Por último, o Vice-presidente e vereador da Cultura, Luís Diamantino elogiou o empenho dos que fizeram acontecer: “Tenho que agradecer à directora da Biblioteca, Lurdes Adriano e a todos os seus colaboradores, exemplares no seu trabalho. Quanto ao livro ‘Contra Mim’ do Valter, leva-nos para a nossa infância e juventude, passada nas Caxinas, na Póvoa, no bairro Sul, mas não posso deixar de agradecer ao Tomás esta exposição, a sua perseverança. Ele tem qualquer coisa de utópico, quer ir mais além, criar um museu de arte contemporânea. É o sonho que o leva para a realidade”. 

Por: José Peixoto

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