Voz da Póvoa
 
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Nos Deuses devem estar Poucos Festivais tão Clássicos

Nos Deuses devem estar Poucos Festivais tão Clássicos

Cultura | 6 Agosto 2025

 

Somos levados pelos sons de uma imagem, Ravel é bem capaz de ser ele próprio o Bolero. Olho aquele violino e ouço Beethoven, agora os dedos no piano a antecipar o arrepio, o sentimento ou o dia mais do compositor. Naquela orquestra há uma humanização de intérpretes que se tornam autores, vozes que nos guiam pelo encanto do poema, pela lírica. Um soprano no feminino parece um anjo a soprar nas feridas de todas as guerras. A arte não tem pátria e isso é um problema para os filhos do ódio que em tudo semeiam aguilhões.

No ano passado, os sons da Palestina interpretados por “Le Trio Joubran”, dos irmãos Adnan, Samir e Wissam Joubran. Este ano o Festival convidou a Orquestra Afghan Youth, dirigida por Tiago Moreira da Silva. A orquestra de jovens, fundada por Ahmed Sarmast, está exilada em Portugal, único país que lhes abriu a porta, após a tomada do poder pelo regime Taliban, está em Braga desde 2022. A música é qualquer coisa de maldição para os líderes afegãos. Mais uma vez, o director do Festival Internacional de Música da Póvoa de Varzim, Raúl da Costa, abriu asas à liberdade, ao reforço da identidade musical e à reconstrução de um futuro novo para o sonho.

Tal como Pablo Neruda escreveu há uma ‘Residência na Terra’ ocupada pelo Quarteto Verazin e uma bailarina muito capaz de transformar o Sara em campo fértil de inspiração, transpiração e improviso. Sara Garcia deixou para mais tarde as asas e voou até ao aplauso merecido. Pelo meio, a jovem soprano Beatriz Patrocínio, vencedora do Prémio Jovens Músicos 2024, fez-nos acreditar em anjos.

A harmonia entre o palco e o público, em cada silêncio uma delicada introspecção, em cada nota uma letra, sempre a soletrar nas cordas, nos sopros nas vozes. O músico é um romance histórico, capaz de nos surpreender em cada palco. A fotografia é o registo intemporal de um momento capaz de nos explicar o antes e o depois. Na expressão do maestro está a antecipação do prelúdio, o músico é bem capaz de responder como uma voz, como uma anunciação do mestre. Quem nos transmite sabedoria não deveria fazer outra coisa. Quem assistiu no Póvoa Arena ao espectáculo encerramento da 47ª edição do FIMPV pela Orquesta del Lyceum de la Habana, liderada pela trompista Sarah Willis, com direcção musical de José António Pádron, entre tantos outros desassossegos, que entre 11 e 27 de Julho, se apresentaram na Póvoa de Varzim, sabe do que falo.

Por José Peixoto

Fotos: FIMPV

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