Voz da Póvoa
 
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Estendal de Peixe ao Sol de um Tempo Antigo

Estendal de Peixe ao Sol de um Tempo Antigo

Cultura | 6 Fevereiro 2025

 

A secar ao sol, pendurado no estendal ou numa armação em rede com quatro pernas ou mais de madeira, enfiadas na areia da praia. Seria esta a melhor maneira de conservar o pescado em tempos imemoriais. Podemos recuar à época dos descobrimentos para nos agarrarmos a uma ideia, uma narração pura e dura. O peixe seco era a única forma de conservar, armazenar o prato das longas viagens. Podemos, mas não devemos chamar-lhe tradição, quando na realidade esta forma de manter o peixe comestível está muito mais próximo da necessidade, da condição das gentes do mar que encontraram na secagem o melhor frigorífico, electrodoméstico que durante muitas décadas só entrava na cozinha de gente de outras castas sociais.

A memória, a minha não chega lá, mas contaram-me que a secagem do peixe beneficiava os dias de escassez, de mar zangado com os barcos, tão zangado que os pescadores faziam-nos trepar pelas areias acima até uma zona segura da sua ira. A praia do peixe entre a igreja da Lapa e o Casino, era um areal de lanchas e catraias dos bravos mestres e pescadores poveiros. Há também quem afirme que as peixeiras, quando o mar era um susto de água, uma angústia de promessa de forme, garantiam o sustento dos seus rebentos vendendo peixe seco nos mercados, mas também no porta-a-porta, apregoando a novidade do carapau, dos batuques, da raia, da sardinha, da petinga, do cação ou do polvo, entre outros. 

A secagem também era sinónimo de abundância de peixe, uma forma de não o perder. Estripado, andava à procura desta palavra para melhor tirar a tripa ao peixe, lavá-lo, passar em salmoura, aberto e escalado antes de ser estendido ou colocado no estendal. Mas, a petinga, a sardinha ou o polvo secam por inteiro, sem esventrar. O sol ou o seu calor o dirá, mas normalmente são precisos dois ou três dias. O vento também dá a sua ajuda.

Depois de entrar no mundo desta técnica ancestral de conservação do peixe que, por laivos raros, ainda se vê no Bairro dos Pescadores ou num vislumbre de crença nas areias da praia, chegamos à parte da delícia que pode ser na mesa, o peixe seco. A sua textura promove no cozinhado um sabor único. Há pratos tradicionais portugueses como ensopados e caldeiradas procurado em bons restaurantes. No entanto, a tradição sempre aconselhou o seu preparo ao ar livre.

Agora que promovi a água na boca, aconselho um bom vinho para acompanhar a tradicional refeição.

Texto e Fotografia: JP

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