Que forças pesadélicas ergueram este terrestre cimento panótico?
Sem cotovelos mediúnicos, retro-projecta-se o pensamento escrito de Gramsci nas suas Cartas da Prisão : «Il vecchio mondo sta morendo. Quello nuovo tarda a comparire. E in questo chiaroscuro nascono i mostri.“ (O velho mundo está a morrer. O novo demora a aparecer. E neste claro-escuro nascem os monstros).
Voltamos a desembarcar em Creta.
Desembarcar, tal como um parto, é chegar.
Vir da ilha do pai, ser metido na barca da mãe, ser desembarcado no umbral entre a água e a areia, estar transfer para uma nova barca, o berço, e finalmente abastecer, só com a presença, o contraste com a epigenética de aleatório quilate, já que a epigenética não é imune aos espaços e seus preenchimentos, podendo a neuroarquitetura fazer a combinação da relação com os outros e com o redor, edificado ou não.
Longe dos Campos Elísios, dos Tártaros ou de outros mundos subterrâneos, à frente, atrás e dentro do corpo humano, ergue-se sem cessar, como o Temple Expiatori de la Sagrada Famíli de Gaudi, expiando e espiando, o Labirinto, a expressão palaciana mais tecnológica e mais intensa, encomendado pelo Poder de Creta (ilha grega onde, na mitologia, terá nascido Zeus.)
A criação é a arte da fuga ao labirinto.
Zeus e os outros deuses embestaram na criação do mundo para fugir ao labirinto onde viviam, através do cordão umbilical de Ariadne, reduzido simbolicamente a fio, a gps de retorno, ao neuroarquiteto e designer Dédalo com intuitos transtaurinos.
Como desde sempre, hoje Creta é “todo o mundo / todo o mundo lhe pertence “parafraseando, na demanda da pedra filosofal, o poeta António Gedeão.
Se Camus, no seu Mito de Sísifo, afirma que a questão filosófica mais importante é o suicídio, podemos agora, 81 anos depois de tal publicação textual, elaborar em modo apotegma na afirmação de que a questão filosófica mais importante reside no labirinto.
Como sair do Labirinto?
Sem denegações, poderíamos dizer que uma das saídas foi o capitalismo através de um imposto carnal com que o Monstro era alimentado, cuja erradicação só podia ser feita pelo Desejo, ou mais comummente pelo Teseu. Outra das saídas foi, em mimesis de ave de arribação, um mero trânsito para o mesmo, através da cera cretense, algo de extrema atualidade, deslocação corporizada por Dédalo quem, pelo ar, de ares mudou para a Trinácria (Sicília), onde ainda hoje é possível hereditariamente percecioná-lo.
A Saída, porém, como Exit, é a linfa de Ícaro. E não se trata daquela explicação psico-manufatural da aproximação ao Sol, liquefazendo o motor ceráceo. É mais luz, mais lúcido, apreendê-lo (até porque antecipa Cristo em mais de um milhar de séculos) como Ressurreição. Não estamos na Paz. Estamos na Páscoa.
Aurelino Costa