A vida é sempre curta quando vivida. Depois, somos, os vivos, provocados pela partida dos que nos habituamos a admirar, a gostar, a amar. O Pessoa ofereceu-nos heterónimos capazes de nos interrogar, Carmen Dores representou personagens no teatro e no cinema, capazes de a eternizar.
Nasceu em Lisboa, a 22 de abril de 1924, deu voz como declamadora e actriz na rádio, e no cinema, onde protagonizara filmes como “A vizinha do lado”, de António Lopes Ribeiro, e “Amor de Perdição”, de Leitão de Barros, o realizador do filme Ala-Arriba. A sua estreia nos palcos aconteceu no Teatro da Trindade em 1945. Mais tarde representou no Teatro Nacional D. Maria II, então com a Companhia Rey Colaço – Robles Monteiro. Carmen Dolores mostrou o seu talento na maioria dos palcos portugueses durante 60 anos, um percurso que teve também passagens por companhias independentes, cinema, rádio e televisão.
A sua última aparição em público aconteceu em 2005, com a peça “Copenhaga”, no Teatro Aberto, encenada por João Lourenço.
Carmen Dolores participou no Correntes d’Escritas de 2013, onde integrou uma mesa e apresentou o seu segundo livro “No Palco da Memória”. O primeiro livro de memórias saiu com o título “Retrato inacabado”.
Na altura a actriz confessou que gosta de escrever desabafos “e comecei a anotar numa espécie de diário o que me ia acontecendo, o que ia observando, o que me despertava mais interesse… e assim surgiu este livro ‘No Palco da Memória’, para que fique um registo daquela que ainda sou, uma referência aos trabalhos em que fui participando, e até um recordar do que se escreveu a meu respeito”.
O livro é um verdadeiro testemunho de uma mulher dos palcos e do seu tempo. As estreias, as interpretações no teatro, cinema e televisão, mas também as amizades com actores e escritores conhecidos do grande público, tudo isto podem encontrar na leitura e nas fotografias do arquivo pessoal de Carmen Dolores.
Em julho de 2018, recebeu do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, as insígnias de Grande-Oficial da Ordem do Mérito, depois de anteriormente ter sido condecorada pelo chefe de Estado Jorge Sampaio com o grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique.
Carmen Dolores foi também distinguida com a Medalha de Ouro da Câmara Municipal de Lisboa, o prémio Sophia de Carreira, da Academia Portuguesa de Cinema, e o Prémio António Quadros de Teatro, entre outros galardões.
No dia 15 de Feveiro, o teatro não ficou mais pobre, apenas perdeu o brilho de uma estrela e ganhou a representação de uma saudade.